Apesar do aparente alívio no mercado financeiro, que viu redução na intensidade da crise política no início desta semana, os dados da movimentação de investimentos estrangeiros no Brasil mostram outro cenário. Conforme dados do Banco Central, em abril houve saída líquida (descontadas as entradas) de investimento financeiro de US$ 7,3 bilhões, US$ 4,9 bilhões em títulos de dívida e US$ 2,4 bilhões em ações e fundos de investimento. No primeiro quadrimestre de 2020, a fuga desse tipo de movimentação de capital chega a US$ 31,4 bilhões. E nos 12 meses encerrados em abril de 2020, acumula US$ 49 bilhões.
Economistas são unânimes em diagnosticar as causas da saída maciça: redução no juro básico, que representa menor ganho para esse tipo de investidor, crise global, que leva recursos para mercados de menor risco e a crise política brasileira acentuada no mês passado pelo Planalto.
Ao escrever o artigo Casa do Brasil em Chamas, o coordenador da área de Economia Aplicada do FGV Ibre, Armando Castelar, chamou atenção para essa combinação inflamável de cenários. Se parte dessa combinação inevitável — Selic menor e pandemia —, o terceiro componente é manejável. Caso a condução da crise fosse serena e responsável, parte do custo seria menor.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, já disse que investimento financeiro em dólares não interessa ao Brasil, exatamente por buscar o ganho fácil do juro elevado. Costuma afirmar, quando confrontado com a fuga de capitais, que o interessante é o aporte produtivo em projetos de longo prazo.
Essa outra modalidade de entrada de divisas, conhecida como investimento direto, é a que representa compra e instalação de novos negócios no Brasil. De fato, costuma compensar, com folga, eventuais saídas de especuladores. No mês passado, no entanto, a soma de todos os movimentos nessa área foi de US$ 234 milhões, o menor valor para abril desde 1995. É um dado que costuma ser expresso em bilhões. Em abril de 2019, havia alcançado US$ 5,1 bilhões.
Conforme dados preliminares do Banco Central, o problema não se restringe a abril. A prévia dos primeiros 21 dias de maio já acumula saída de US$ 2,8 bilhões em investimento financeiro, dos quais US$ 1,8 bilhões em ações e fundos. Há um alento: no período ainda dominado pelas crises patrocinadas pelo presidente Jair Bolsonaro, o investimento direto voltou à casa do bilhão: US$ 1,3 bilhão.
Em artigo recém-publicado nesta quarta-feira (27), Roberto Padovani, economista-chefe do banco BV, pondera que a recessão que o Brasil enfrenta pode ser dividida em dois momentos. No primeiro, prevaleceram os impactos desconhecidos da pandemia sobre a economia. "A partir de agora, o foco são os ruídos políticos e seus efeitos sobre confiança e retomada", avalia. E projeta: "A sobreposição de riscos globais e domésticos justifica a revisão para pior do PIB no terceiro trimestre, permitindo desenhar uma recessão superior a 7% ao ano".
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