Antes da pandemia, era Paulo Guedes, ministro da Economia. Mas quando o coronavírus virou de cabeça para baixo as prioridades planetárias, o papel de fiador da credibilidade global do Brasil passou a ser o médico de fala mansa que ocupava, até esta tarde, o Ministério da Saúde. A cada declaração ou atitude irresponsável do presidente Jair Bolsonaro, o Brasil perdia mais um naco de sua imagem já desgastada desde a desastrosa condução da crise das queimadas na Amazônia.
Mas em um momento no qual as informações sobre saúde são as que cruzam o planeta com maior velocidade, as ponderações sobre o equilíbrio de Luiz Henrique Mandetta compensavam, em boa parte, a aura negativa que cerca o Palácio do Planalto.Aos poucos, os líderes globais foram todos convergindo para a mesma estratégia.
Até o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, cederam à observação dos fatos e à ciência. No Brasil, prevaleceu o obscurantismo. Se o Brasil já era visto como um país pouco confiável, agora terá de mitigar o risco de consolidar a imagem de pária global.
O fiador da economia, a propósito, havia dado seu aval ao sucessor, perante a comunidade global. Há uma semana, já dava seu aval à estratégia de Mandetta, que é a resposta global ao vírus:
– Eu mesmo, como economista, gostaria que pudéssemos manter a produção, voltar o mais rápido possível. Eu, como cidadão, seguindo o conhecimento do pessoal da Saúde, ao contrário, quero ficar em casa e fazer o isolamento.
Não é por acaso que quem entende de números e tem domínio de raciocínios abstratos adota essa posição: há uma fórmula reconhecida mundo afora sobre a progressão geométrica do contágio. Se no Brasil o caos não se instalou na rede de saúde, foi pelo sucesso relativo da estratégia. Se há esperança de que não ocorra, era porque teremos, como nação, pagando o custo da prevenção.
Sem Mandetta, o governo brasileiro deixa clara sua opção: mantém no cargo um ministro que faz comentários rasteiros e de mau gosto sobre o maior parceiro comercial do Brasil, colocando em risco até o fornecimento de equipamentos usados para o tratamento de doentes por coronavírus, e despacha o que vinha preservando as conexões do país.
Nesta semana, em editorial, o jornal americano Washington Post observou que a pandemia se tornou um teste global de qualidade em governança. No topo da avaliação, estão Nova Zelândia, Taiwan, Coreia do Sul e Alemanha. Mas o texto continua assim: "O fundo do poço também chama a atenção: nele estão os da Belarus, Turcomenistão, Nicarágua e Brasil, que ignoram a seriedade do vírus e incentivam a população a agir como se nada estivesse ocorrendo. Deles todos, o caso mais grave é o do presidente brasileiro Jair Bolsonaro".
Se no Exterior os produtos brasileiros já eram associados a um país sem compromisso ambiental, agora podem vir a ser relacionados à falta de responsabilidade no combate à pior pandemia em séculos. Nelson Teich, o sucessor de Mandetta, tem de assumir o compromisso de não permitir essa consequência.