Desde que ficou claro que o governo estava dispsto a mudar a condução econômica, com planos opostos ao da escola do ministro da Economia, Paulo Guedes, instalou-se o debate público sobre a permanência no governo de seu fiador na elite econômica do país. As dúvidas ficaram tão intensas que, na manhã desta segunda-feira (27), Bolsonaro resolveu encenar um "dia do fico" de Guedes na saída de uma reunião no Palácio da Alvorada.
Acompanhado por Guedes e os ministros da Agricultura, Tereza Cristina, e da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, Bolsonaro fez questão de avisar:
– Acabei mais uma reunião aqui tratando de economia. E o homem que decide a economia no Brasil é um só: chama-se Paulo Guedes. Ele nos dá o norte, nos dá recomendações e o que nós realmente devemos seguir.
Depois da demissão ruidosa de Sergio Moro do Ministério da Justiça, o que era visto como simples desgaste de Guedes virou temor de mais uma fritura em praça pública de um dos superministros de Bolsonaro. Na sexta-feira passada, analistas ligados ao mercado financeiro e mesmo os mais acadêmicos já discutiam abertamente o risco de saída de Guedes do governo.
Na origem do desgaste, esteve a concepção e a apresentação do que foi chamado de "Plano Marshall", depois batizado de Pró-Brasil, apresentado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto. Embora a apresentação tenha mais confundido do que esclarecido, duas coisas ficaram claras: era uma mistura do planejamento nacionalista do desenvolvimento do regime militar com o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) adotado na crise de 2008, que deixou um rastro de obras inacabadas pelo país, o que preocupou investidores e analistas.
Uma terceira pode não ter ficado clara, mas inspirou o plano: uma tentativa de impedir que a crise econômica decorrente do coronavírus comprometesse irremediavelmente a reeleição de Bolsonaro. Até por isso, embora a sinalização desta segunda-feira (27) tenha sido poderosa, não basta. Se de fato quer manter Guedes, Bolsonaro terá de agir para manter o compromisso. O Pró-Brasil pode não passar do rascunho que foi, e até o futuro de Rogério Marinho no Mnistério do Desenvolvimento Regional. Apontado como real motor do Pró-Brasil, Marinho foi acusado de "desleal" por Guedes na frente de colegas. Guedes deu a senha de ter afastado outras influências:
– Queremos reafirmar a todos que acreditam na política econômica que ela segue e a mesma política econômica.
Mas uma outra frase, que não foi dita nesta segunda-feira, segue definindo bem as mais recentes movimentações do governo Bolsonaro. Foi dita por Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde, às vésperas de sua demissão:
– Você conversa hoje, a pessoa entende, diz que concorda, depois muda de ideia e fala tudo diferente. Você vai, conversa, parece que está tudo acertado e, em seguida, o camarada muda o discurso de novo.
O trio que cercou Bolsonaro tem mais em comum do que assuntos relacionados à economia. São vistos, no empresariado e entre economistas, como o time racional da Esplanada. São uma reserva de confiança em um ministério recheado de radicais ideológicos e currículos com escassez de competência. Lá estava, também, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, cujo protagonismo durante dias em que Guedes estava recolhido havia chamado atenção. Se não mudar de ideia no dia seguinte, o presidente compra algum tempo.