Foi justamente saindo de um encontro com potenciais investidores no Brasil que o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, pronunciou uma frase que pode espantar eventuais interessados no Brasil. Logo depois de pedir a prática da democracia, o ministro a desafiou, ao afirmar:
– Não se assustem então se alguém pedir o AI-5.
O Ato Institucional Número 5, ao qual o ministro se refere, foi o ápice da ditadura no Brasil. Suspendeu direitos individuais, fechou o Congresso, acentuou a censura a imprensa e, com essas ferramentas, permitiu tortura e assassinato de opositores. É a perfeita tradução das repúblicas de bananas, nas quais só o que vale é a vontade do governante de ocasião. Também é espantalho para empresas que têm de cumprir mandatos com um tripé onipresente: livre mercado, Estado de Direito e segurança jurídica. A objeção só veio mais tarde:
– É inconcebível, a democracia brasileira jamais admitiria, mesmo que a esquerda pegue as armas, invada tudo, quebre e derrube à força o Palácio do Planalto, jamais apoiaria o AI-5, isso é inconcebível. Não aceitaria jamais isso.
Ainda faltou a condenação pública de quem "pede AI-5", como ocorreu quando o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ) fez o mesmo, em público. A reação foi tamanha que teve de pedir desculpas, depois de ser repreendido até pelo pai, o presidente Jair Bolsonaro. Desta vez, porém, o presidente não foi tão enfático. Preferiu dizer que Guedes só cuida da economia.
É por isso mesmo que deveria se preocupar – e desautorizar o ministro – de maneira enfática. Se a declaração de Eduardo Bolsonaro pode ser lida como uma forma de agitar e fidelizar eleitores e simpatizantes que se movimentam nas redes sociais, o AI-5 na boca de um ministro da Economia com passagem pelo Chile durante o governo de Augusto Pinochet é muito mais grave. E ainda pior vinda de um economista que se diz "liberal". Depois do "liberal na economia mas conservador nos costumes", teremos "liberal na economia mas autoritário no governo"?
Ao contrário dos anos 1960, quando a guerra fria ainda autorizava multinacionais a buscarem resultados mesmo em repúblicas de bananas, o avanço da civilização permitiu incluir nos estatutos de empresas o compromisso com democracia, liberdade, ambiente e diversidade. Na ditadura, houve o chamado "milagre brasileiro". A conta chegou depois, em forma de inflação e desestruturação da economia. O mundo mudou, ministro. Lucro agora precisa de chancela social.