Se o dia anterior já havia terminado com desconforto no Congresso diante das mudanças embutidas na reforma da Previdência para os militares, a prisão do ex-presidente Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco complica ainda mais a chance de tramitação rápida. Temer não é só um ex-presidente: passou as últimas três décadas acionando os cordões que movem o Legislativo.
Se não bastasse, Moreira Franco é padrasto da mulher de Rodrigo Maia (DEM-RJ), espécie de “primeiro-ministro” da reforma. É quem defende a mudança com mais empenho, depois de Rogério Marinho, secretário especial de Previdência e Trabalho.
É esse cenário mais complexo para a reforma da Previdência que o mercado viu ontem ao reagir com alta de 0,9% no dólar, para R$ 3,80, e queda de 1,34% na bolsa de valores, para 96,7 mil pontos.
– A prisão joga gasolina nas tensões entre a classe política e as forças da Lava-Jato e pode tornar mais complexo o acerto por reformas – avalia André Perfeito, economista-chefe da Necton.
– A reforma agora fica adiada até a volta da normalidade. Tudo sai de esquadro neste momento. Os parlamentares já correram para salvar a pele. Um projeto que coíbe o abuso de autoridade foi aprovado no Senado e está indo para a Câmara – observa Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.
O analista lembra que o mercado abrira “azedo” – bolsa em queda e dólar em baixa –, porque investidores e especuladores estavam “tentando digerir melhor a contribuição dos militares” na reforma da Previdência. Com a prisão, aprofundou os movimentos:
– A expectativa era outra, depois do discurso de Bolsonaro de que todos fariam sacrifício. Não foi bem assim do lado dos militares.
A materialização do risco de atraso foi o cancelamento da agenda de Maia, com o consequente atraso na definição do relator da reforma na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Agora, avalia Agostini, o governo terá de avaliar como fica seu capital político para negociar o avanço do projeto. João Augusto Frota Salles, analista da Lopes Filho & Associados, lembra que há duas vertentes na queda da bolsa. Uma é a realização de lucros. Depois de o Ibovespa cruzar os 100 mil pontos, era preciso vender papéis para embolsar os ganhos.
– A outra é a dificuldade no campo político para avançar as reformas e o plano dos militares com ajuste de cargos e salários.