A importação de bananas do Equador, que provocou um desabafo do presidente Jair Bolsonaro na semana passada, é a nova vilã de uma novela equatoriana que já vai para a terceira temporada. Um detalhe: enquanto no ano passado o Brasil vendeu ao Equador
US$ 34 milhões em calçados – apesar dos problemas entre os dois países –, comprou apenas US$ 268 mil em bananas. Na semana passada, quase no mesmo dia do pronunciamento de Bolsonaro nas redes sociais, os fabricantes brasileiros de sapatos – concentrados no Rio Grande do Sul – foram alertados que o país comprador havia voltado impor restrições à entrada do produto. O presidente fez o seguinte raciocínio:
– Como é que pode uma banana sair do Equador, andar
10 mil quilômetros, passando pelo canal do Panamá e pelo porto de Santos, e chegar a um preço competitivo lá no Ceagesp, em São Paulo, se a 150 quilômetros de São Paulo você tem o Vale do Ribeira, cuja economia em grande parte é a banana?
Os episódios começaram em 2017, quando o Brasil colocou barreiras à entrada de camarões e bananas do Equador.
Nos dois casos, a alegação era de que doenças nos dois produtos, que entram frescos por aqui, poderiam contaminar a produção nacional. Nos dois casos, o Ministério da Agricultura se manifestou afirmando que esse risco não existia. O problema
da banana foi resolvido em seguida, o do camarão, só no final do ano passado.
– Nossa alegria não durou dois meses – observa Priscila Link, coordenadora de Inteligência de Mercado da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados).
Na semana passada, a entidade foi alertada pelos clientes do Equador que o país havia voltado a acionar um instrumento chamado de "dúvida de qualificação de origem". Um acordo no âmbito do Mercosul permite que os calçados brasileiros entrem no Equador sem pagar tarifa de importação. Mas tem de comprovar que não têm muitos componentes importados. Quando a dúvida é lançada, o país comprador trata o produto nacional como os dos demais fornecedores, cobrando alíquota de 10% mais US$ 6 a cada par. Até que a origem seja confirmada, porém, é preciso depositar garantias no mesmo valor, o que eleva o preço dos sapatos brasileiros em relação aos competidores.
Essa barreira havia sido levantada no ano passado, mas voltou depois de a Confederação Nacional dos Bananicultores ter obtido uma liminar, no início deste mês, contra a entrada da fruta do Equador na primeira instância da Justiça. A Abicalçados não é parte nessa disputa, mas acompanha o caso para defender o interesse das indústrias associadas.
A diferença de peso
Em 2018, o Brasil exportou 2,9 milhões de pares de calçados para o Equador, o equivalente
a US$ 34 milhões. O país foi o nono maior destino das exportações do segmento. Esse resultado foi obtido mesmo com a medida de "dúvida de origem" em vigor por sete meses.
O valor da importação de bananas do Equador pelo Brasil, que está em 62º lugar na lista de destinos da fruta, foi de US$ 268 mil. O Brasil é o quarto maior produtor de bananas do mundo, com 6,7 milhões de toneladas anuais, e as plantações equatorianas garantem o quinto posto, com 6,3 milhões de tonelada ao ano.
Os episódios
2017: o Brasil barra a entrada de bananas e camarões do Equador alegando risco de que doenças provenientes da entrada de produtos frescos se tornasse um risco de contágio.
O país sul-americano impõe, pela primeira vez, restrições a entrada de calçados nacionais. No caso do camarão, a ameaça era uma doença chamada mancha branca. No das frutas, um vírus do Mosaico das Brácteas da Bananeira (BBrMV), que provoca defeitos no crescimento dos cachos.
2018: os produtores de camarão do Brasil entram na Justiça e mantêm a proibição à entrada de camarões com liminar obtida no Supremo Tribunal Federal (STF), só derrubada no final do ano
2019: no início de março, a Confederação Nacional dos Bananicultores entra na Justiça e obtém liminar, em primeira instância, para impedir a importação de bananas equatorianos no Brasil. O Equador volta a impor restrições aos calçados brasileiros.