Desde que se soube da reunião do agora ex-presidente da Petrobras, Pedro Parente, com o presidente da República, Michel Temer, havia suspeitas no ar. O executivo não resistiria à pressão e às mudanças improvisadas pelo governo federal na política de preços que havia devolvido musculatura à empresa. Nos últimos dias, o prestígio de Parente não estava em queda apenas entre caminhoneiros e sindicalistas, mas sob escrutínio de empresários e executivos. Confirmada, a renúncia de Parente cria mais turbulência em momento já crítico, com a economia abalada pela greve dos caminhoneiros.
O mercado reagiu imediatamente, com bolsa mudando de direção, de alta para queda, e elevação no dólar. Até o risco Brasil, medido pelo instrumento que representa seguro contra calote, sobe perto de 4%. As ações da Petrobras despencaram tanto que entraram em leilão, mecanismo acionado quando a variação passa muito do habitual. O mesmo ocorreu, mas porque os papéis deram um pinote para cima, com a BRF, que deve ser o próximo emprego de Parente.
A coluna conversava com o ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), David Zylbersztajn no momento do anúncio da renúncia de Parente, que havia tirado a Petrobras da beira do abismo. O especialista não
se surpreendeu, mas reagiu com preocupação:
– A gente esquece o que ocorreu com a Petrobras há tão pouco tempo. Minha preocupação maior não é nem pelo Pedro, mas por quem vai entrar. Vai continuar essa política ou vai voltar à antiga. Se voltar, a empresa perde de novo a reputação que havia recuperado.
Mas até Zylbersztajn, que na ANP atuou para abrir o mercado de petróleo e derivados à iniciativa privada, admite que a estratégia dos reajustes diários pode ser revista. Só adverte que a razão da alta dos combustíveis – alta do petróleo e do dólar – não mudou. Ainda. Zylbersztajn está entre os especialistas que prevê uma baixa na cotação internacional do petróleo ainda neste mês.
Leia a carta de demissão de Pedro Parente entregue a Michel Temer
Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
"Quando Vossa Excelência me estendeu o honroso convite para ser presidente da Petrobras, conversamos longamente sobre a minha visão de como poderia trabalhar para recuperar a empresa, que passava por graves dificuldades, sem aportes de capital do Tesouro, que na ocasião se mencionava ser indispensável e da ordem de dezenas de bilhões de reais. Vossa Excelência concordou inteiramente com a minha visão e me concedeu a autonomia necessária para levar a cabo tão difícil missão.
Durante o período em que fui presidente da empresa, contei com o pleno apoio de seu Conselho. A trajetória da Petrobras nesse período foi acompanhada de perto pela imprensa, pela opinião pública, e por seus investidores e acionistas. Os resultados obtidos revelam o acerto do conjunto das medidas que adotamos, que vão muito além da política de preços.
Faço um julgamento sereno de meu desempenho, e me sinto autorizado a dizer que o que prometi foi entregue, graças ao trabalho abnegado de um time de executivos, gerentes e o apoio de uma grande parte da força de trabalho da empresa, sempre, repito, com o decidido apoio de seu Conselho.
A Petrobras é hoje uma empresa com reputação recuperada, indicadores de segurança em linha com as melhores empresas do setor, resultados financeiros muito positivos, como demonstrado pelo último resultado divulgado, dívida em franca trajetória de redução e um planejamento estratégico que tem se mostrado capaz de fazer a empresa investir de forma responsável e duradoura, gerando empregos e riqueza para o nosso país. E isso tudo sem qualquer aporte de capital do Tesouro Nacional, conforme nossa conversa inicial. Me parece, assim, que as bases de uma trajetória virtuosa para a Petrobras estão lançadas.
A greve dos caminhoneiros e suas graves consequências para a vida do País desencadearam um intenso e por vezes emocional debate sobre as origens dessa crise e colocaram a política de preços da Petrobras sob intenso questionamento. Poucos conseguem enxergar que ela reflete choques que alcançaram a economia global, com seus efeitos no País. Movimentos na cotação do petróleo e do câmbio elevaram os preços dos derivados, magnificaram as distorções de tributação no setor e levaram o governo a buscar alternativas para a solução da greve, definindo-se pela concessão de subvenção ao consumidor de diesel.
Tenho refletido muito sobre tudo o que aconteceu. Está claro, Sr. Presidente, que novas discussões serão necessárias. E, diante deste quadro fica claro que a minha permanência na presidencia da Petrobras deixou de ser positiva e de contribuir para a construção das alternativas que o governo tem pela frente. Sempre procurei demonstrar, em minha trajetória na vida pública que, acima de tudo, meu compromisso é com o bem público. Não tenho qualquer apego a cargos ou posições e não serei um empecilho para que essas alternativas sejam discutidas.
Sendo assim, por meio desta carta, apresento meu pedido de demissão do cargo de Presidente da Petrobras, em caráter irrevogável e irretratável. Coloco-me à disposição para fazer a transição pelo período necessário para aquele que vier a me substituir.
Vossa Excelência tem sido impecável na visão de gestão profissional da Petrobras. Permita-me, Sr. Presidente, registrar a minha sugestão de que, para continuar com essa histórica contribuição para a empresa — que foi nesse período gerida sem qualquer interferência política — Vossa Excelência se apoie nas regras corporativas, que tanto foram aperfeiçoadas nesses dois anos, e na contribuição do Conselho de Administração para a escolha do novo presidente da Petrobras.
A poucos brasileiros foi dada a honra de presidir a Petrobras. Tenho plena consciência disso e sou muito grato a que, por um período de dois anos, essa honra única me tenha sido conferida por Vossa Excelência.
Quero finalmente registrar o meu agradecimento ao Conselho de Administração, meus colegas da Diretoria Executiva, minha equipe de apoio direto, os demais gestores da empresa e toda força de trabalho que fazem a Petrobras ser a grande empresa que é, orgulho de todos os brasileiros."
Respeitosamente,
Pedro Parente