Economistas estão em polvorosa, a bolsa que testava recordes sucessivos recua – discretamente, mas recua. São os reflexos da bomba H dos balões de ensaio do governo Temer: o estudo de uma proposta de emenda constitucional para flexibilizar a chamada “regra de ouro” do ajuste fiscal: não emitir dívida em valor maior do que o dos investimentos públicos. O mínimo que se ouve é de que, se prosperar, a medida pode descascar o verniz do ajuste.
– Se confirmada, é um enorme retrocesso na busca de maior responsabilidade fiscal – avalia Aod Cunha, ex-secretário da Fazenda do Estado que ficou conhecido pelo déficit zero.
Técnicos do governo, entre os quais a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, que chegou ao cargo credenciada por um duro ajuste fiscal promovido em seu Estado de origem, Espírito Santo, reagem a críticas de colegas com a garantia de que seu compromisso é defender a responsabilidade fiscal, especialmente a regra de ouro, mas ponderam que, sem a reforma da Previdência e outros avanços no corte de despesas, o risco de bater no teto do gasto público e entrar em shutdown – corte automático de despesas, com cessação de prestação de serviços públicos – é crescente.
Além de parecer uma confissão da descrença na aprocação da reforma da Previdência, o estudo da suspensão da regra de ouro – seria temporária – representa a negação de tudo a que o governo Temer se propôs. É bom lembrar que sua antecessora, Dilma Rousseff, sofreu impeachment por pedaladas fiscais. Mas nem ela ousou mexer na regra de ouro.
Aod aponta outra consequência potencialmente desastrosa: com o fim da regra de ouro, ainda que temporário, em tese o governo federal poderá autorizar operações de crédito para Estados pagarem despesas correntes, como a folha de salários – em ano eleitoral, caso a PEC seja aprovada nos próximos meses.
O governo Temer brinca com fogo: depois dos arranhões éticos, sua única razão de existir era o reformismo, como o marketing tenta embalá-lo. Abandoná-la pode significar o abandono até pelos 6% que ainda veem virtudes em seus propósitos.