Imerso em uma corrente de calotes, que envolve governos, empresas e cidadãos, o Brasil ensaia uma saída da crise ainda arrastando grilhões de dívida. Mesmo depois da liberação das contas inativas do FGTS, houve um repique no percentual de famílias com contas em atraso. Boa parte do problema tem raiz na recessão, que ceifou vendas, produção e empregos.
Outra parte tem conexão mais antiga e profunda, a falta de cultura de respeito a orçamentos. Isso vale para governos, empresas e pessoas. Nesse caso, o mantra não é cortar gastos, mas gastar bem.
Pesquisa do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) investigou o comportamento dos inadimplentes. O resultado qualitativo não surpreende, mas o quantitativo assombra: 47% dos "negativados" sabem pouco ou nada sobre seus rendimentos e 41%, idem sobre as contas básicas – luz, telefone, aluguel ou prestação da casa, escola.
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No lado das convicções, 85% consideram importante ter "nome limpo" e 79% avaliam que é preciso honrar compromissos financeiros. É evidente a lacuna entre crenças e prática. Durante a fase mais aguda da recessão, não poucos economistas advertiram que crises também têm papel pedagógico. Ensinam a perceber que todo ciclo de alta um dia murcha e que é preciso poupar para imprevistos. É importante reter essas lições no início da escalada do fundo do poço.
Aprender a lidar com orçamento não é crucial só para consumidores. No país em que 59% dos inadimplentes sabem pouco sobre valores de suas compras no crédito, fica fácil enrolar cidadãos com orçamentos públicos irreais. Não precisa nem gastar verbo, em vez de verba, para ampliar rombos já profundos.