Não será nem o paraíso pintado por entidades empresariais, nem o caos retratado pelas sindicais, mas os efeitos da terceirização geral e irrestrita virão. Não serão tão rápidos quanto foi a aprovação surpresa de um projeto que mofava nas gavetas do Congresso, mas são inexoráveis, para usar uma palavra do tempo da criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Mudanças viriam, aliás, com ou sem a nova legislação. O tamanho da transformação pela qual passa o universo da produção e do trabalho ainda não é percebido por todos, mas as novas gerações não trabalharão mais – boa parte já não o faz – como as que as precederam. A aprovação da nova regra foi tão rápida que nem os empresários sabem exatamente que tipo de chances e riscos se abrem. Os sindicatos intuem mais perigos do que oportunidades, e vão tentar barrar judicialmente a medida, o que aumenta a incerteza sobre seu impacto.
Mas até porque demissões em massa custam caro – e os tempos não estão para gastos inesperados – o cenário de curto prazo não é de zerar quadros funcionais com passagem generalizada dos trabalhadores para um intermediário, que também embute custo. Por enquanto, o que se ouve dos empresários é de que o mecanismo será usado de forma complementar, para suprir períodos curtos ou específicos de mão de obra temporária. Será assim para sempre? É uma questão em aberto.
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O maior problema da aprovação das novas regras de terceirização foi o escasso debate que geraram. Passaram com rapidez inusual por um Congresso com baixa legitimidade, sem tempo para reflexão e projeção de consequências. Por isso mesmo, despertaram as piores suspeitas, baseadas no retrospecto recente, sobre as motivações da tramitação relâmpago.
Mas tanto quem está ansioso por terceirizar quanto quem teme ser terceirizado deve pensar duas vezes: no primeiro caso, a eficiência e o comprometimento da mão de obra podem mudar. No segundo, quem vai ler e responder e-mails de trabalho 24 horas por sete dias da semana se além do chefe direto tiver um contratante de mão de obra?
Segurança jurídica no Brasil é escassa, e aumentá-la faz diferença. Mas ter princípios básicos de decência na contratação é um requisito cada vez mais observado, vigiado e controlado, não pela legislação, mas pelo consumidor. Mesmo no meio de uma crise profunda e longa como a do Brasil, qualquer mudança nas relações de trabalho terá de passar pela incerteza do impacto nas únicas forças capazes de transformar esse cenário: a natureza humana e a produtividade.