Uma das condições para apoio de alguns dos aliados de maior visibilidade do governo interino de Michel Temer era de que ele não alimentasse expectativas de permanecer na Presidência pela via eleitoral. A justificativa pública – além de não querer mais um adversário em 2018 – era a de que a difícil situação econômica do Brasil exigia a adoção de medidas duras, sem as quais o país não teria conserto. A perspectiva de eleição o faria hesitar.
Veio a formação do ministério. Os primeiros sinais apontavam para o corte drástico demandado pela crise e pela necessidade de "dar o exemplo". Depois, a necessária construção de apoio quase deixou a Esplanada do mesmo tamanho. Pegou mal, voltou a equipe enxuta. Passaram-se 10 dias de protestos, e foi anunciada a recriação do Ministério da Cultura. Mais uma pasta abala as contas públicas – aquelas mesmas sobre as quais foi anunciado um risco de rombo de R$ 170,5 bilhões? Claro que não. A cultura é um segmento essencial da vida nacional, trata-se da identidade, ou da "alma" de um país? Sem dúvida.
O problema é que o governo piscou. Não suportou a pressão de uma decisão impopular. É difícil medir o impacto de um coro de pessoas inteligentes e capacitadas cantando "Fora Temer" ao som de Carmina Burana – um dos muitos atos de protesto da semana passada –, mas o atingido não resistiu. E agora? As circunstâncias da ascensão de Temer à Presidência, o déficit de notáveis e o superávit de investigados já deixavam seu governo exposto ao barulho das ruas. O risco é estabelecer o precedente: mesmo tomada a decisão, é possível recuar diante de reação negativa.
Vai ocorrer o mesmo com a Previdência?
Nos últimos dias, filtrou-se a versão de que a mudança de regras para quem já está no mercado de trabalho é só o "bode na sala" – aquele que, ao ser retirado, alivia o cenário e torna o resto aceitável. Sabe-se que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, só aceitou o cargo sob condição de total autonomia. Levou junto a Previdência, para afastá-la do sindicalismo que daria o tom na pasta onde a despesa de mais de um quarto do orçamento estava alojada.
Na sexta-feira, preferiu adjetivos a dados para explicar a nova meta fiscal. Na terça-feira, enfrenta sua primeira batalha épica no Congresso. Quem vai piscar?