É a bordo do slogan 'the best burger in the world' (o melhor búrguer do mundo) que a rede Madero desembarca em Porto Alegre, no final do mês. Vem com a pretensão assumida do chef Luiz Renato Durski Júnior, hoje já mais conhecido como Júnior Durski, 54 anos, que tem uma história de vida e de empreendedorismo peculiares.
Passou 12 anos na Amazônia como madeireiro, atividade da qual desistiu, reconhece, por "vergonha". No comando de uma rede de 65 restaurantes, com 2,4 mil funcionários, Durski afirma que seu negócio ainda não afetado pela crise. Estima que o período de dificuldades esteja na metade, e está preparado para sobreviver bem por mais um ano e meio.
– Se for mais do que isso, complica – avalia.
O que o levou à Amazônia?
Meu pai e meu avô eram madeireiros no interior do Paraná. Fiz Direito na faculdade, mas não me identifiquei com a profissão, fui trabalhar com meu pai e gostei. Como o ciclo da madeira no Paraná já estava no final e eu tinha 22 anos, quis fazer algo diferente. Na época, 1984, havia incentivo do governo federal para ocupar a Amazônia. A prefeitura de Ouro Preto do Oeste (RR) deu terreno, o Banco do Estado de Rondônia, que não existe mais, fez deu financiamento. Fui sozinho, e acabei ficando 12 anos como madeireiro.
Era desflorestamento ou reflorestamento?
Como venho de família de madeireiro, amava o que fazia. A grande sacada na vida é gostar do que se faz. Esse negócio de fazer o que se gosta é meio utopia, meio viagem. Gostar do que se faz é mais prático. Eu gostava da floresta, por mais que cortasse árvores. É uma atividade ótima, se for bem-feita. Em países europeus, madeireiros são muito bem vistos, como nos Estados Unidos. Na França, floresta cresce todos os anos, e o carvalho demora 200 anos para crescer. Talvez no Brasil algum dia também seja assim. Estava financeiramente, tive duas filhas lá. Mas chegou a um ponto em que as meninas estavam com 10, 11 anos, não tinha mais como ficar. Estava em Machadinho do Oeste, que era conhecida como a capital nacional da malária. Eu tive três vezes. Quando minha filha mais nova, a Maísa pegou malária com oito anos, pensei 'tenho de ir embora e levar essas meninas'. A vida no Norte é muito dura, é outra cultura. Eu tinha ganhado dinheiro, não havia sentido ficar no meio do mato. Em 1999, mudei para Curitiba. Mantive as madeireiras por um tempo, depois vendi para sócios. Virei trader, comprava madeira de toda a América do Sul e exportava para o mundo inteiro. Mas sentia falta de cozinhar. Em Rondônia, fazia almoço e jantar todo dia, e minha família sempre deu valor à boa mesa. Fazia jantares em casa, para os amigos, mas os caras não iam embora (risos). Era meia-noite e os caras estavam lá em casa.
Antes de avançar, vamos voltar um pouquinho. Você chegou a ser vereador?
Em Prudentópolis, era uma cidade importante do Paraná. Eu fazia faculdade de Direito, era um jovem idealista. Meu bisavô, coronel José Durski, havia sido o primeiro prefeito dessa cidade, então fui candidato, aos 20 anos. Fui um dos cinco mais votados de 11 eleitos. Na carreira política, tive duas grandes felicidades: quando me elegi e quando renunciei àquela porcaria, dois anos depois. Não dava, era uma coisa absurda. Para um jovem idealista, tudo era bobagem, perda de tempo, jogo de cartas marcadas. Era mesquinharia. Era completamente diferente do que pensava. Renunciei. Era um salário que hoje equivaleria a R$ 4 mil ou R$ 5 mil reais, não era por aquilo que ia ficar.
Alguma vontade de retomar a carreira?
Nossa, não, não. Quando parei de ser madeireiro, me comparei muito aos políticos. Deixei de ser madeireiro há cinco anos. Tanto quanto no Congresso ou na Assembleia do RS tem deputados sérios e honestos, e tenho certeza que tem, é muito difícil para essa meia dúzia dizer que é honesto e alguém acreditar. É uma caixa de laranja que tem três boas e 200 podres. Na atividade da madeira, chegou a um ponto que eu tinha vergonha de dizer que era madeireiro. Fui para Brasília, disse que a salvação da Amazônia é a atividade extrativista, a madeireira é uma delas. A atividade florestal é ótima do ponto de vista da conservação. Ao madeireiro, só interessa a floresta em pé. Se derrubar, acaba o negócio. Não acho que a Amazônia seja o lugar certo de ser fazendeiro, e sim no Cerrado, no Nordeste. Eles querem cortar tudo, plantar pasto e criar boi, isso não se deve fazer. Mas madeireiro entra na floresta, escolhe algumas árvores, depois a floresta se recompõe, nunca vai acabar. Mas não tem estrutura para fazer isso bem-feito, aí vira sacanagem e se desvirtua. Sempre fiz tudo para que minhas quatro filhas se orgulhassem de mim, e elas não tinham orgulho de dizer às amigas do colégio que o pai era madeireiro. Isso me matava. Puxa, o que estou fazendo. Vou parar com esse negócio aí, não quero mais.
Mas os restaurantes nasceram da vontade de cozinhar?
Abrimos o Restaurante Durski. Não quis fazer somente comida polonesa, porque tem uma rixa com descendentes de ucranianos no Paraná, é como argentino e brasileiro. Era 100% hobby, não tinha a pretensão de ganhar dinheiro com isso. Do ponto de vista de crítica foi muito bem, tinha vários prêmios, mas de público nem tanto. Tinha mais no final de semana, é uma comida mais 'sustanciosa'. Não dava lucro. Isso me incomodava, dava um prejuizinho, achava aquilo injusto. No lado, tinha um imóvel que era um bar. Era no centro histórico de Curitiba. Acabei comprando o bar, que atrapalhava, porque era mal frequentando. Em 2005, abri o Madero, com o objetivo de parar o prejuízo como Restaurante Durski. Otimizava custos, a caixa cuidaria dos dois restaurantes, o manobrista também.
O nome vem da atividade madeireira ou de Puerto Madero, de Buenos Aires?
Vem dos dois. O Puerto Madero é um lugar que eu adoro. Gosto daquela região, acho fantástica.
A empresa tem uma história de dificuldades entre 1999 e 2005, cumpriu a trajetória de aprender com erros?
Abri seis restaurantes, e os seis davam prejuízo. Abri o Durski, dava prejuízo, abri o Madero Prime, ao lado, não deu certo também. Abri em outros shoppings, que não eram o lugar certo, para o público certo. Tentamos em Balneário Camboriú, inauguramos em janeiro, foi maravilhoso, tinha congestionamento na Avenida Atlântica com a fila. Quando acabou a temporada, acabou o negócio, micou. Foi uma lástima. Então tinha seis indo muito mal de clientes e muito bem de crítica. Todo mundo falava bem do restaurante, e eu pensava 'desgraçado, porque não vai lá, então?' (risos).
Aí caiu a ficha do preço?
Vi que o produto era caro. Refiz toda a conta. Se já dava prejuízo caro, tinha de aumentar muito a quantidade de pessoas, então tinha de ganhar no volume. Baixei, de uma vez, 42%. Fiz algumas alterações no produto sem mexer na qualidade. Tinha um hambúrguer de 260 gramas, que demorava 17 ou 18 minutos para grelhar, a demora incomodava o cliente. Fiz dois de 130 gramas, com a mesma carne, mesma qualidade, até melhorou de sabor. Baixei o tempo de grelha de 17 para sete minutos, consegui grelhar mais. Fiz umas limpezas, tirei o couvert. Aí estourou. No primeiro mês, tivemos aumento de faturamento de 300%, mesmo descontada a redução nos preços de 42%. Aí entendi que você conquista o direito de cobrar certo preço, tanto em restaurante quanto em qualquer outra atividade.
O slogan 'the best burger in the world' foi propositalmente pretensioso?
É muito pretencioso, mas a ideia sempre foi ser muito provocativo. Desde o começo esse foi o slogan. Sempre achei que era o melhor do mundo e acho até hoje. Sei do risco que corro. O produto tem de ser no mínimo sensacional ou passo vergonha.
O restaurante de Miami já abriu?
Abriu em novembro de 2015, e continuamos com o slogan lá (risos). Está indo muito bem. A clientela é 70% americana e 30% de brasileiro. E é uma região que americano reclama de ir, que é a Ocean Drive, é ruim de estacionar. Temos 65 lojas, estamos construindo em Sidney, na Austrália, que inauguramos em julho, e outra em setembro. Também temos negociações adiantadas em Abu Dhabi.
A empresa já foi avaliada em R$ 900 milhões?
No ano passado, faturamos R$ 334 milhões. Um fundo, que queria comprar uma parte, avaliou o negócio em R$ 900 milhões, baseado no múltiplo da geração de caixa. Mas não quisemos vender. A rede é 100% minha e do meu time. Tenho seis diretores com stock options, e 2,4 mil funcionários. A responsabilidade de ser dono é grande. Não tem franquia. O restaurante que estamos abrindo em Porto Alegre é meu, e convido alguém para ser sócio local, mas regido pela CLT, ganhando salário, com participação nos lucros, por isso é sócio. Se porventura não se alinhar e não mantiver qualidade, trocamos.
Demorou para chegar ao Rio Grande do Sul por falta de oportunidade ou medo de concorrer com o churrasco?
(risos) Não tinha medo nem pretensão de concorrer com churrasco. Ninguém faz churrasco melhor do que cada um dos gaúchos que estão em suas casas. Não é the best barbecue... (risos) A gente demorou para ir por questão de oportunidade, mesmo. Também tinha otimização de logística, como temos fábrica no Paraná, os caminhões são nossos, somos muito verticalizados.
Vocês fabricam até o pão?
A gente faz tudo o que serve no restaurante. Fazemos pão, o hambúrguer, a linguicinha, defumamos o bacon, fazemos o petit gateau. Toda essa produção sai da fábrica de Ponta Grossa, cidade a 90 quilômetros de Curitiba, inaugurada no ano passado. É meu parque de diversão.
A crise está afetando o negócio?
Não, não está. Temos duas situações: nos restaurantes em cidades grandes, não mudou nada, não caiu o faturamento. Nas cidades menores, a venda caiu uns 20%. Entretanto, isso não tem afetado nossos números porque tinha gordura para queimar. Buscamos mais eficiência, mais trabalho, menos desperdício. Deve-se cortar gordura, só não pode cortar na veia. Se corta a veia, morre. Não pode perder qualidade, sou um desesperado por qualidade. Por outro lado, tem oportunidades, com essa crise, que não teríamos. Estamos correndo bastante para aproveitar bem a crise agora. As negociações com os shoppings estão maravilhosas. Um grande operador do Brasil está pagando até as obras. Tem muita loja entregando o ponto, e o que gera fluxo, hoje é entretenimento e alimentação. Outro lado bom da crise é que sempre tivemos dificuldade em contratar pessoas. Precisamos de mil pessoas. Hoje podemos ser mais seletivos, exigir mais do funcionário, que atenda melhor, seja mais eficiente, simpático, agradável, rápido. Também melhorou a negociação com os fornecedores. Compramos grandes volumes.
E como estão os planos de expansão?
Estamos revendo, em função das oportunidades. Faríamos 25 restaurantes em contêineres e seis em shoppings. Com as ofertas que recebemos, vamos fazer 15 em contêineres e 15 em shoppings. Diminuímos o número, de 33 para 30, mas com aumento no volume de venda.
Quanto tempo dá para suportar a crise?
A gente está estimando que passou a primeira metade, considerando que começou no final de 2014. Então estamos preparados para mais um ano e meio. Está firme, diminuindo mais um pouco de custo melhorando eficiência. Mas não pode passar muito disso, senão complica. Na Argentina, 40 anos de populismo não quebraram o país, não serão 16 que vão quebrar a gente aqui.