No dia seguinte ao bloqueio de R$ 21,2 bilhões do orçamento, para tentar evitar um rombo ainda maior, o governo anunciou nesta quarta-feira que o déficit primário da União roçará os R$ 100 bilhões neste ano: serão exatos – até onde se pode ver neste momento – R$ 96,65 bilhões. Se a credibilidade e o apoio do governo federal sangram, esvai-se também a expectativa de não permitir a piora da percepção sobre a situação financeira do país.
Resultado primário é a mesma coisa que qualquer família faz em casa ao fim de cada mês: uma reserva para garantir que as dívidas não se transformarão em uma bola de neve. Por isso costuma ser traduzido por “economia para pagar os juros da dívida”. Esse sé um detalhe importante: a finalidade não é sequer quitar as pendências, apenas impedir que se acumulem ainda mais. Quando é déficit, vira o raciocínio de cabeça para baixo. Juro não pago vira mais dívida. E mais dívida piora a percepção dos credores sobre a capacidade de honrar os débitos.
Foi o que fez o Brasil perder todas as notas em grau de investimento. A nova estimativa do governo sobre o rombo nas contas está R$ 36,45 bilhões acima do previsto há apenas um mês. Ao explicar a necessidade do que chama de “flexibilização da meta fiscal”, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, apontou a premência de se adequar ao novo cenário de arrecadação (quebra de R$ 82 bilhões em relação ao orçado).
Na segunda-feira, Barbosa havia apresentado propostas palatáveis no pacote de reestruturação da economia, mas deixou a notícia-bomba para dois dias depois. No ano passado, a dívida bruta (sem descontar ativos) do governo federal bateu em 66% do Produto Interno Bruto (PIB) e, com mais um déficit acumulado, pode ultrapassar 70% neste ano. Sim, ainda está distante de países que quase quebraram nos últimos anos, todos com dívida acima de 100% do PIB. Mas o que o mercado vê com inquietação é a trajetória que piora sem parar.