Quase todo adolescente, pelo menos uma vez, já largou esta frase para seus pais:
— Eu não pedi para nascer.
O dito vem geralmente depois de alguma cobrança que lhe fizeram. O argumento desarma os pais, e o adolescente aproveita para sair de cena.
O que se pode dizer nessa hora? Não é simples, mas podemos pegar uma direção. A primeira coisa é fazê-lo notar a extraordinária coincidência. Veja só, meu filho, eu também não pedi para nascer, tua mãe tampouco pediu para nascer. Indo mais longe, que se saiba, nestes milhares de anos em que nossa espécie existe, ninguém pediu para nascer.
Enfim, filho, você não está sozinho nesse ponto. Mas diga, como você imagina que poderíamos ter te feito a pergunta: queres nascer?
Depois podemos relatar uma constatação filosófica básica: todos nós já existíamos antes de nos darmos conta da existência. Quando acordamos para o mundo, já estávamos aqui.
Podemos seguir dizendo que essa ideia vem bem, pois ela pode ajudá-lo a mudar de postura. Quando ele entender a profundidade dessa questão, saber que faz parte de uma comunidade de seres iguais nesse ponto, poderá escolher se vai remar junto, ajudando os familiares e amigos a levar melhor a vida, ou se vai ficar sozinho em um canto, não fazendo nada e reclamando por existir.
Existe uma variação dessa questão, que é a pergunta: por que vocês me fizeram? A resposta é caso a caso. Mas o padrão geral seria dizer que acreditávamos no futuro, queríamos devolver ao mundo a sorte que tivemos em conhecer a magia da vida e do amor. Em outras palavras, relançar o dom que recebemos de nossos pais.
Durante a conversa, vem bem lembrá-lo da liberdade que tem. O fato de ter nascido em uma família não quer dizer que ele terá que ser igual a ela e pensar como eles. Crescer é fazer escolhas. É a chance de tomar o que veio dos pais e fazê-lo seu, da sua maneira. Porém, este processo é correlato ao de ganhar autonomia e sair da asa protetora dos pais.
Por último, dizer que nem sempre a realidade nos dá segurança para termos a coragem de colocar um filho no mundo. Porém, ele foi gerado numa janela de crença no futuro. Ter um filho é sempre um ato de esperança.