Nesta semana, a coluna se dedicará a contar casos curiosos, bizarros ou até pitorescos no mundo do futebol. É o esporte avançando em limites sociopolíticos e geográficos dos países. O primeiro episódio conta a história de Guiana, Guiana Francesa e Suriname, que estão na América do Sul, mas não disputam as competições da Conmebol.
Automaticamente, por não fazerem parte da entidade sul-americana de futebol, as Guianas e o Suriname não podem participar das competições organizadas pela Conmebol, como as Eliminatórias do continente para a Copa do Mundo e também a Copa América, além dos torneios em nível de clubes, caso da Libertadores.
O fato é que estes países são membros da Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe (Concacaf). Apesar de geograficamente fazerem parte da América do Sul, as Guianas e o Suriname não integram a Conmebol por conta de um acordo com a Fifa. A razão da entidade é que as três seleções têm mais chance de progresso no futebol jogando contra adversários das outras Américas. Ou seja, o critério é estritamente técnico.
Raízes do futebol
Mesmo desconhecidos dos olhos do mundo em termos de futebol, você sabia que jogadores renomados têm raízes nas Guianas e no Suriname? Este último, 141º colocado no ranking da Fifa, está nas biografias do zagueiro Virgil van Dijk e do meio-campo Georginio Wijnaldum, ambos do Liverpool, atual campeão europeu.
Apesar de terem nascido na Holanda, Van Dijk e Wijnaldum são cidadãos surinameses e poderiam defender a seleção que nunca disputou uma Copa do Mundo. O zagueiro mais caro do futebol, avaliado em 80 milhões de euros (quase 450 milhões de reais), é filho de mãe surinamesa com pai holandês. Já a família do meia é 100% da América do Sul, e seus pais migraram para a Europa antes do seu nascimento.
Suriname, que é uma antiga colônia da Holanda, tornou-se realmente independente durante a década de 1970, mas sofre com a perda de talentos do futebol para a antiga colonizadora. Nomes como de Clarence Seedorf e Edgar Davids também nasceram lá.
O ex-jogador da seleção francesa Florent Malouda, vice-campeão mundial em 2006, nasceu em Caiena, capital da Guiana Francesa. Em 2017, inclusive, Malouda concretizou um sonho de atuar pela seleção local, disputando a Copa do Caribe, torneio regido pelas regras de elegibilidade da Concacaf, o que não feriu o regulamento da Fifa, que proíbe um jogador de defender duas seleções. Algo que não foi aceito para a Copa Ouro, a qual a Fifa proibiu de ser disputada pelo jogador.
Quais competições estes países disputam?
Conforme ranking da Fifa, Suriname é 141º colocado, enquanto a Guiana aparece na 166ª colocação. A Guina Francesa, por ser uma região ultramarina da França, não é filiada à entidade e só pode disputar competições que não estão no guarda-chuva da entidade, como a Copa do Caribe citada anteriormente.
Guiana e Suriname, portanto, disputam inclusive as Eliminatórias para a Copa do Mundo via Concacaf, mas jamais conseguiram a tão sonhada vaga. O único título da equipe surinamesa foi no Campeonato de Nações do Caribe, em 1978. Já os guianenses, da antiga colônia britânica, conseguiram recentemente o melhor resultado de sua história: classificação para a fase de grupos da Copa Ouro.
Conmebol está de olho
Existe um projeto da Conmebol para aumentar o número de filiados. Atualmente com 10 seleções (Brasil, Argentina, Uruguai, Chile, Paraguai, Equador, Colômbia, Peru, Bolívia e Venezuela), a ideia é justamente incorporar Suriname e Guiana.
O interesse é político e também econômico. Com mais filiados, consequentemente a Conmebol aumentaria o número de votos no Congresso da Fifa, que trata de temas importantes, como a escolha da sede da Copa do Mundo. Aliás, a confederação sul-americana é a que tem menos membros no mundo. Até a Oceania soma mais: 11 no total.
Há também uma questão financeira que envolve o projeto. A Fifa tem medidas de desenvolvimento do futebol em países com poucas estruturas para o esporte, despejando milhões de dólares para aperfeiçoamento de profissionais, construções de campos, entre outros pontos. A Conmebol obviamente fica de olho neste dinheiro, podendo gerenciar verbas maiores e inclusive auxiliar melhor países como a Bolívia e a Venezuela, que também tem dificuldades no contexto esportivo.