Agora que as campanhas de Lula e Bolsonaro parecem já ter discutido o suficiente sobre maçonaria, satanismo e canibalismo, quem sabe sobra um espaço para que os dois digam como pretendem cuidar do futuro do Brasil, a começar pela estabilidade econômica.
Exigir que candidaturas abordem com realismo a economia não é fazer o jogo do mercado, como espertamente tentam se desvencilhar adjuntos de ambas as campanhas. A apresentação de propostas sólidas sobre de onde os candidatos vão arranjar dinheiro para quitar um mundaréu de promessas não é só uma obrigatória testagem da veracidade dos seus menus de intenções. É na economia que reside o combate à inflação e à miséria e o financiamento público da saúde, da educação e da infraestrutura. Ou seja, é o futuro do governo e do próprio país que os dois deveriam estar esmiuçando agora, e sem meias palavras ou tergiversações.
Pela voltagem das promessas, cada um já estourou em mais de R$ 150 bilhões o orçamento para 2023. É pacote de bondade para todos os lados. Para a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600, compromisso de ambos, faltam R$ 52 bilhões. A promessa de Lula de corrigir a faixa de isenção do IR custa outros R$ 17 bilhões e a de Bolsonaro de pagar uma 13ª parcela a mulheres chefes de família que recebem o auxílio sai mais R$ 10,1 bilhões. E por aí vai. Só falta dizer que um gnomo trará saquinhos de moedas enterradas no subsolo e as distribuirá aos brasileiros sem produzir o descontrole da inflação e a manutenção dos juros nas alturas.
Como dinheiro não surge por milagre ou boa vontade, os dois poderiam ser sinceros sobre como pretendem bancar esses gastos. Vão aumentar impostos? De quem, em quanto, como farão para aprovar um aumento no Congresso? Quanto vão produzir de recessão e evasão com as propostas? De boas intenções uma reforma tributária está cheia, mas tanto Lula quanto Dilma e Bolsonaro passaram ao largo de desatar o emaranhado fiscal do país.
Em vez de tratar do futuro, Lula e Bolsonaro se agarram ao passado como suposta prova de suas capacidades. Lula, nos oito anos de governo em que surfou condições externas muitas vezes únicas, de fato demonstrou responsabilidade fiscal, mas também abriu as comportas para inchar a máquina, o que se reflete em aumento de despesas com o funcionalismo por pelo menos mais uma geração. Bolsonaro prometeu um governo de mais Brasil e menos Brasília e acabou concentrando enorme poder no Planalto e às turras com prefeitos e governadores que tiveram os cofres minados com a imposição da redução do ICMS.
O mundo mudou muito desde as posses de Lula e Bolsonaro, mas a Brasília dos dois segue uma ilha da fantasia assolada por pesadelos de satanismo e canibalismo. É pouco, muito pouco, para quem quer governar 212 milhões de brasileiros pelos próximos quatro anos.