Na marcha para as eleições de 2022, o fosso entre apoiadores e opositores do presidente Jair Bolsonaro vai sendo escavado a cada meme agressivo, a cada discussão áspera no WhatsApp, a cada tuíte com reações ofensivas ou a cada manifestação com o objetivo de aguçar rancores. Escaladas de radicalização, nas quais os dois lados apontam seus dedos para o outro, só levam a um destino: o esfarelamento de relações pessoais, com a consequente divisão do país em grupos em constante confronto. Povos conhecem sua derrocada assim, até que surjam iniciativas capazes de reatar as partes em discórdia.
Um extraordinário exemplo de esperança pode ser conferido no recém-lançado filme Oslo (HBO), que retrata as conversações secretas entre Israel e a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) que conduziram aos célebres Acordos de Oslo, em 1993. Mais do que refletir sobre ganhos e perdas de cada lado, o filme se concentra no método para que dois inimigos de morte se sentem, conversem e cheguem a um denominador comum.
É uma boa inspiração para o Brasil e outras nações dilaceradas por ódios e desprezos mútuos. Graças ao empenho de um casal norueguês, formado por um sociólogo e uma diplomata, as conversas entre israelenses e palestinos ocorrem em sigilo por meses a fio em uma mansão nas cercanias de Oslo. Os dois lados se digladiam e se xingam na sala de reuniões, mas, pelo acordo com os facilitadores noruegueses, fora dela devem conviver como amigos. O gelo se quebra quando as partes se reconhecem como pessoas comuns, com famílias e sonhos, que contam piadas e apreciam a boa mesa – os pendores da cozinheira norueguesa ajudam, por certo.
A equação do acordo – superar divergências históricas, respeitar o contendor e reconhecer legitimidade em suas posições – também só chega a bom termo porque os líderes de Israel, o primeiro-ministro Yitzahk Rabin, e da OLP, Yasser Arafat, demonstram disposição de, para o bem de seus povos, interromper a torrente de rancor. “Chega de lágrimas, chega de sangue”, resumiu Rabin na assinatura do acordo nos jardins da Casa Branca, sob as bênçãos de Bill Clinton, numa das imagens mais memoráveis do Século XX. Por seus esforços, Rabin, Arafat e Shimon Peres, chanceler israelense, ganharam o Nobel da Paz de 1995.
Para interromper a escalada de ódios no Brasil, é preciso primeiro haver o desejo de alguma paz. É necessário também que todas as partes em atrito – dos líderes partidários aos eleitores comuns – voltem a conversar, nem que seja para falar de hobbies e filhos, pondo de lado as acusações mútuas por fatos do passado. Até aqui, não se vê desprendimento nas lideranças políticas brasileiras para baixar a temperatura. Será preciso, portanto, pressão de baixo para que o país acorde antes que seja tarde demais.