De pequena já implicava com política, essa entidade esquisita de que muito se falava.
Comentários em geral não muito lisonjeiros e ficava imaginando por que alguém ambicionaria um cargo tão malvisto.
Certa vez, meu pai foi instado por seu partido a se candidatar à prefeitura de nossa pequena (naqueles tempos) cidade. Lembro dele se questionando, dialogando com minha mãe, caminhando de mãos nas costas no longo caminho de lajes que levava até o fim da propriedade.
Eu sabia que ele estava refletindo.
Por fim, um dia anunciou na mesa do almoço que ia aceitar, fazer uma campanha limpa, sem falsas promessas, sem iludir as pessoas.
Não tenho grandes recordações de detalhes, eu devia ter seis ou sete anos, mas por algum tempo houve uma agitação diferente na casa. Meu pai saía de carro com companheiros para “fazer campanha”, e perguntando entendi que era pedir votos.
Achei esquisito, pois sendo ele conhecido e respeitado como homem culto, bom, honrado, por que não o escolheriam todos espontaneamente?
Quando mais uma vez perguntei, desta vez diretamente a ele, achou graça e me disse que até Cristo, vindo à Terra como candidato, não teria vitória garantida.
Não entendi, mas fiquei achando perigosa e traiçoeira essa senhora Política.
Afinal, nessa sua única tentativa de se envolver com ela, entusiasmado com sua proposta de honradez, clareza e sinceridade, meu pai foi fragorosamente derrotado.
Não sei detalhes, sei de minha mãe chorando e repetindo “eu te disse pra não se envolver nisso”, meu pai alguns dias mais taciturno, muitos telefonemas chegando, e, por fim, alguma vez ele se dizendo aliviado, “eu realmente não sirvo pra isso, muito sacrifício”.
Estou comentando essas memórias da remota infância nestes dias doidos em que tudo vira política, a começar pelo diabólico coronavírus: “realidade ou invenção causando pânico planejado” ou “doença grave que parou o mundo, matou milhões e vai nos deixar mais pobres, atrasados e isolados, com que ninguém ainda sabe lidar direito”?
Brigas políticas ou ideológicas (há diferenças, ideologia é palavra um pouco mais nobre?) atrasam lamentavelmente até uma possível vacina; enganam e prejudicam multidões que debocham de cuidados essenciais como isolamento e máscara; e, ao menos por aqui, deixam muita gente atordoada, agressiva, criando inimizades antes inimagináveis.
Talvez política não sirva para isso, mas idealmente deveria ajudar a pensar e a se posicionar para o bem geral, liderar com sabedoria e humanidade, e nos tornar um pouco mais tranquilos, realizados, ao menos esperançosos.
Lembro meus seis ou sete anos e nossas escolhas. Será que em algumas coisas progredimos?