Neste estado de entressono em que nem velamos nem dormimos, alinhavei há pouco o texto abaixo, que agora arrumo como quem arma um brinquedo muito amado.
Se este mundo fosse meu, eu reinventaria a vida.
As pessoas seriam mais tranquilas e pacientes – não demais, ou seriam moles e sem graça.
Se este mundo fosse meu, eu mudaria os amores, que seriam menos controladores, menos inseguros, menos egoístas e jamais cruéis. Não perfeitos, pois seriam amores humanos com todos os nossos jeitos e carências.
Se este mundo fosse meu, não haveria terras sem gentes nem gentes sem terras mas todos teriam um lar para viver, florestas para passear, campos para correr ou plantar, ruas para se encontrar, árvores para admirar. Mas ninguém tentaria tirar a terra do outro, pois haveria espaço de sobra para cada um.
Se este mundo fosse meu, haveria mais música e cantos do que gritos e xingamentos, mais palavras ditas com afeto, ou com sabedoria, com alegria. Mas haveria também segredos e prantos e chamados e confidências, porque, mais uma vez, seríamos apenas humanos... mas sem hipocrisia nem perversidade.
Se este mundo fosse meu, não haveria mães sem filhos nem filhos sem mães... e pais também. Porque arrancarem alguém assim do nosso lado é um horror que ninguém merece.
Se este mundo fosse meu, eu deletaria a mentira, a hipocrisia, a pobreza, a miséria, a fome e o abandono. Mas deixaria umas mentirinhas inocentes para depois a gente rir junto, tipo “claroooo que eu ainda te amo!”. E deixaria alguma necessidade, alguma ambição e desejos para que sempre houvesse vontade de melhorar.
Se este mundo fosse meu, eu inventaria viagens para conhecer todos os lugares do mundo como em mil tapetes mágicos que nunca se chocariam nos ares porque seríamos espertos demais.
Se este mundo fosse meu, eu desinventaria a solidão e a morte. Pois todos teríamos ao menos um amor e várias amizades, e em lugar de adoecer e morrer, quando velhinhos mas ainda lúcidos e firmes, iríamos nos desvanecendo devagar, cada vez mais leves e transparentes, sem agonia ou desespero – porque todos saberiam que essa separação seria só transitória.
E, se este mundo fosse meu, seríamos no fim como fiapos de nuvens e novelos de cores pairando, girando ou voando em pura beleza, reflexos de luz e formas móveis, pelo espaço afora ou perto dos que nos amam.
Se este mundo fosse meu, seria em tudo maravilhoso e bom..