A imensa novidade que era, uns 10 ou 15 anos atrás, a publicação de escritoras africanas e afrodescendentes no Brasil entrou agora numa velocidade de cruzeiro. Nomes como Conceição Evaristo, Cidinha da Silva, Lília Guerra, Fernanda Bastos, Dalva Maria Soares, Taiasmin Ohnmacht ou Nathallia Protazio, entre as brasileiras, ou Bernardine Evaristo, Jamaica Kincaid, Akwaeke Emezi, Scholastique Mukasonga, Buchi Emecheta e Paulina Chiziane estão nas prateleiras, nas listas de leituras, nas mesas de cabeceira e no coração de milhares de olhares leitores.
O que resultará desse encontro? Como essas vozes, esses pontos de vista, essas vivências entrarão na circulação cultural entre nós, ao longo do tempo? Que repercussão causarão na sensibilidade geral? Algo comparável ao que se chamou “boom” da literatura hispano-americana, nos anos 1970? Comparável à voga do conto como forma de eleição da nova geração entre nós, nos mesmos anos 1970?
São perguntas talvez ociosas, mas que devem ocorrer a quem pensa a literatura como fenômeno de leitura, não apenas de edição – historiadores, críticos, professores. Tendências, talvez modas, que varrem o cenário como ondas e mesmo tsunamis, que passam mas deixam na praia algum traço de sua passagem.
Li agora meu segundo livro da excepcional narradora que é Chimamanda Ngozi Adichie. Conheci logo do lançamento em português seu grande romance Americanah, e agora convivi com os contos de No seu Pescoço (Companhia das Letras). Nigeriana de nascimento, filha de pai e mãe com formação superior, emigrou para os Estados Unidos ainda jovem – e esse deslocamento é tema central do citado romance e de um conto genial do livro, justamente No seu Pescoço.
Suas personagens enfrentam os temas salientes de sua geração e origem étnica – preconceito racial e patriarcalismo, entre os mais agudos – e ao mesmo tempo dialogam com altivez e profundidade com questões por assim dizer clássicas – o amor, o desejo, as injunções e pressões de classe etc. E se trata de personagens complexas, que operam emocionalmente em esferas amplas, para muito além do circuito ideológico imediato, incontornável por um lado, para quem queira encarar o mundo dos eventos concretos, e por outro limitador, para quem se restrinja a ele.
Personagens e histórias de Chimamanda Adichie permanecem ecoando no leitor para muito além dos enredos e circunstâncias objetivas, a indicar a força de sua criação e a provável permanência de sua literatura no tempo.