A Bundelisga é um campeonato que 18 clubes jogam e um sempre ganha. No caso, o Bayern de Munique, campeão nas últimas 11 edições. Nesta temporada, porém, há uma novidade. E que novidade.
O Bayer Leverkusen de Xabi Alonso assombra a Alemanha e a Europa roubando o protagonismo e a cena. Há algo novo surgindo ali. Algo parecido com o que fez Jurgen Klopp no Borussia Dortmund bicampeão em 2010/2011 e 2011/2012. Quando surge algo assim, capaz de desbancar o domínio do time de Munique, é dever parar e se debruçar para entender e esquadrinhar.
Primeiro, vamos a um rápido resgate histórico. Xabi Alonso era, até 2017, aquele volante esguio e de futebol elegante que foi campeão do mundo com a Espanha, brilhou no meio-campo do Liverpool pré-Klopp, no Real Madrid e foi um dos protagonistas do Bayern de Munique de Guardiola e Carlo Ancelotti. Em 2017, encerrou a carreira. Era consenso, no entanto, que ele logo voltaria a ser notícia como técnico.
Dois anos depois, Xabi assumiu o Sanse, a filial do Real Sociedad que disputava a Terceira Divisão espanhola. Basco, orgulhoso de suas origens, o ex-volante tem uma relação familiar com a Real. Foi lá que iniciou como jogador. Seu pai foi jogador e técnico no clube.
Quando pequeno, no começo dos anos 1990, ele se sentava na arquibancada para ver o Sanse comandado pelo pai. Periko, meio-campista como o filho, fez parte da seleção espanhola anfitriã na Copa de 1982. É tratado como lenda no lado azul do País Basco.
Os três anos no Sanse serviram para confirmar a previsão de que Xabi atingiria, como técnico, o mesmo nível que teve como jogador. O que não se imaginava é de que seria tão rápido.
O Sanse tem como missão lapidar jogadores para o time principal. Nada além disso. Ao chegar, Xabi desfez o 4-3-3 espelhado na equipe de cima e adotou seu 3-4-3, com variações para o 3-5-2. Mas, mais do que isso, criou um ambiente de confiança e criatividade e potencializou jovens recém-chegados da base. O Sanse conseguiu um acesso histórico e inesperado na temporada 2020-2021. Caiu na seguinte, por falta de experiência, do técnico e dos jogadores. Porém, o cartão de apresentação de Xabi estava entregue.
Em outubro de 2022, o telefone na casa dos Alonso tocou. Era o Bayer Leverkusen, colado na zona de rebaixamento e em busca de saída depois anos cinzentos, em meio de tabela. O basco, é claro, topou. E deu início à revolução que começou a fazer no futebol alemão, capaz de ameaçar a dinastia do Bayern.
Naquela mesma temporada, ele cravou seu time em sexto na tabela e o levou à semifinal da Liga Europa. Aqui, começa a ficar nítida uma das grandes virtudes do técnico, a capacidade de reconfigurar o time e adequá-lo ao momento. Aquele primeiro Bayer tinha como características um jogo de bloco médio de marcação e muita saída em velocidade, com a dobradinha do lado direito formada pelo holandês Frimpong e o francês Diaby. O Bayer induzia o adversário a sair pela esquerda, para roubar a bola e acionar os dois velocistas.
Diaby se valorizou e saiu, vendido ao Aston Villa. O Bayer, não é à toa, tem o apelido de Werkself, o "onze da fábrica". A Bayer coloca dinheiro, mas cobra resultado e autossustentação. Com os 55 milhões de euros da venda de Diaby, vieram o lateral-esquerdo espanhol Grimaldo, o meio-campista suíço Xhaka, o meia-atacante Hofmann e o centrovante nigeriano Boniface. E sobrou.
Com as novas peças, Xabi deixou de lado o jogo mais reativo e montou uma máquina de jogar para a frente. O 3-4-3 varia para um 5-4-1 na fase defensiva, mas também pode se distribuir em linha de quatro na defesa e em um 4-4-2, como fez contra o Bayern, quando empatou dentro do Allianz.
A ideia de jogo é muito clara. A saída de três é feita com o zagueiro Tah sendo o construtor, remanescente de outros carnavais no Bayer. À frente dele, o suíço Xhaka e o argentino Palacios dão o suporte. Os laterais Frimpong e Grimaldo espetam como ponteiros. Os alemães Wirtz e Hofmann aparecem nas entrelinhas para receber o passe. Que, muitas vezes, aciona a velocidade de Bonface.
O técnico faz do passe o oxigênio do seu time. Diz que todo o seu jogo está alicerçado na qualidade dele. É assim que Wirtz, quando cai para o lado esquerdo e deixa a faixa central para Grimaldo, encontra espaços que poucos vêem. Até a metade do campo Xabi cobra organização e mecânica. Dali pra a frente, quem manda é o jogador, com sua intuição e liberdade para tomar decisões.
A dinâmica de jogo e a autonomia dada aos atletas fazem o Onze da Fábrica bater recordes na Bundesliga. O time lidera com 48 pontos: 15 vitórias e três empates. Fez 50 gols e levou 14. Com o empate de domingo (21) contra o Werder Bremen, de Borré, o Bayern fiou quatro pontos atrás. Daqui a três rodadas, os dois se encontram em Leverkusen. Pode ser que a Bundesliga seja decidida ali.
Porém, o Bayer vai por mais. Na Liga Europa avançou com 100% na fase de grupos, fazendo 19 gols e levando três. Na Copa da Alemanha, venceu as três partidas até agora, com 16 gols marcados e só três sofridos. Na temporada, são 85 gols a favor e só 20 contra. Neste sábado (27), o jogo será contra o Borussia M'Gladbach. Começa às 14h30min. O SporTV transmite. Sugiro que reserve um tempo para assistir. Afinal, se o Real Madrid, o Bayern e o Barcelona estão olhando de perto o time de Xabi Alonso, não seremos nós que viraremos a cara.