Há um perigo em enfrentar essa Croácia: a resiliência dos seus jogadores. Não é coincidência que essa seleção avançou até a final, em 2018, passando por prorrogações e cobranças de pênalti. Assim como não é coincidência que fez um jogo de resistência contra o Japão e avançou nos pênaltis. Eles não desistem. Aprenderam a ser assim desde crianças.
A Croácia de 2022 conserva sete remanescentes da Copa do Mundo da Rússia. Cinco deles nasceram pouco antes ou no ano que estourou a Guerra nos Bálcãs, em 1992, o mais sangrento conflito desde a II Guerra Mundial.
Livakovic, o goleiro, e Kovacic, um dos astros, nasceram no último ano do conflito, em 1995. Passaram parte da infância em campos de refugiados ou vendo, em um país em reconstrução e vendo a família chorar pela perda de parentes e amigos, levados pelas armas das mílicias sérvias, que engajadas a um lider sanguinário, Slobodan Milosevic, não aceitavam a independência croata e bósnia. Essa foi uma guerra em que se tentou fazer uma limpeza étnica. Isso diz tudo.
Foi nesse ambiente que cresceu a base desta Croácia que, daqui a pouco, encara o Brasil no Education City. O que ajudou a moldar a personalidade desses jogadores e criou até alguns comportamentos controversos deles, como o canto de hinos da extrema direita entoados no vestiário depois da classificação à final da Copa na Rússia. Em resumo, o que teremos de camisa quadriculada do outro lado do campo são jogadores forjados na dificuldade, com cicatrizes da infância que os deixaram mais fortes e prontos para qualquer momento de pressão.
O que dizer de Lovren, por exemplo, que tentou se refugiar na Alemanha e, aos 10 anos, teve de voltar para a Croácia porque teve asilo negado. Ou do próprio Modric, cujo avô foi morto com um tiro na cabeça por milícias sérvias que chegaram à vila da família, quando ele pastoreava suas cabras e ovelhas. Aos seis anos, Modric precisou sair com os pais para morar em um campo de refugiados. É por ter histórias como essa e cicatrizes na alma que Ivan Perisic, ao site da Fifa, garantiu que essa Croácia pode dar a volta em qualquer situação.
— Para nós, tudo é possível. Nós temos caráter para virar a situação em qualquer jogo. Somos, realmente, uma seleção muito sólida — disse Perisic, um dos craques do time.
A Croácia é uma espécie de Uruguai. Tem população de 3,89 milhões e jogadores espalhados nos maiores clubes do mundo. O que só nos ajuda a ter cautela. Esses croatas são resilientes e acostumados a encarar desafios na vida e, até mesmo, lutar por ela.