Ouvir uma respiração ofegante e ver uma barriguinha minúscula fazendo esforço para puxar o ar vira sinônimo de desespero e “prepare-se para correr” depois que você se torna mãe. É um misto de sentimentos, que inclui angústia e preocupação, e que também exige uma dose importante de racionalidade para apontar a decisão correta no momento da crise respiratória. Some-se a isso a ansiedade de uma ida à emergência, normalmente lotada de crianças, e pronto. A mãe aqui sofre só de imaginar.
Foi com esse olhar, de mãe de um bebê asmático, que me vi diante do caso do menino Henrique Busnardo. Com 12 anos, o Henrique transparecia a imagem mais impressionante de um quadro de insuficiência respiratória, nas palavras do médico José Camargo.
O menino era portador de uma bronquiolite obliterante (doença que obstrui os bronquíolos) e possuía somente 12% da capacidade pulmonar. Para se ter uma ideia, ele precisava dormir ajoelhado, porque sufocava caso se deitasse normalmente. Imagine o coração dessa mãe. Eu me arrepio em pensar.
Pois bem. O dr. Camargo, se você não conhece, é um craque em cirurgia torácica. Algo como uma mistura de Simone Biles com Rebeca Andrade. É medalha de ouro, sempre. Dedicado a estudar o caso, ele encontrou a solução possível. Um transplante. Alguém haveria de doar um pulmão novo para que Henrique pudesse retomar a vida normal de uma criança saudável.
Contudo, para que isso acontecesse, é preciso lembrar, havia um aspecto importantíssimo: crianças possuem uma caixa torácica pequena. Significava dizer que seria necessário encontrar um pulmão pequeno, de um doador falecido. Isso limitava em muito a chance de contar com um doador com um tamanho compatível com o de Henrique. E não havia tempo para essa espera. A situação era gravíssima.
O drama fez com que o médico cogitasse tornar possível, pela primeira vez no Brasil, um transplante com doadores vivos. Neste caso, dois personagens muito especiais: a mãe e o pai de Henrique. Sim, queridos leitores, pai e mãe doaram parte de seus pulmões para salvar a vida do filho. Uma operação inédita em solo brasileiro. Um feito que ocorreu na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, e que neste mês de setembro completou 25 anos.
Imagine o tamanho da responsabilidade para realizar um procedimento desses! Um feito que exige talento e entrega da equipe médica. Um evento incrível. De arrepiar. Mas que, antes de tudo, não seria possível se não houvesse a doação de órgãos. Pai e mãe doaram vida.
25 anos
Hoje, 25 anos depois, Henrique é um adulto que leva uma vida normal. Trabalha, sai com os amigos e faz exercícios físicos. Ele contou, em entrevista à Rádio Gaúcha, sua imensa gratidão pelo transplante realizado na Santa Casa. E é por este caso que insisto em lembrar que a doação de órgãos – aqui, realizada por pai e mãe – está ao alcance de todos nós. Todos os dias, temos a chance de dizer àqueles que amamos que somos doadores. E, com esse movimento, nos tornamos capazes de ser parte da cura de milhares de pessoas. É esperança de recomeço para quem espera acontecer.
Fale sobre doação
Precisamos falar abertamente sobre doação. Converse. Não hesite. É preciso comunicar isso claramente a quem está perto. No fim, a decisão será daqueles que puderem falar por você. Lembre-se que um único doador pode salvar mais de oito vidas. Dizer sim à doação é poderoso demais. É fazer a vida continuar.