Espectadores pararam em frente à TV ontem para assistir a um momento que prometia, no mínimo, fortes emoções. Com 20 jogadores afastados por conta da covid-19, o River Plate entraria em campo contra o Santa Fé, pela Copa Libertadores, sem qualquer jogador no banco de reservas. Eram onze e nada mais. E acrescente-se: sem goleiro (Franco Armani, Enrique Bologna, Germán Lux e Franco Petroli estavam fora), coube ao volante Enzo Pérez a tarefa de vestir luvas e proteger o arco do ataque do adversário, do alto de seu 1,77m.
Distante dali, um ex-ministro um pouco mais baixo e sem histórico de atleta havia sido convocado para prestar esclarecimentos na CPI da Covid, no Senado. Escoltado pelo filho do presidente da República, Flávio Bolsonaro, o general Eduardo Pazuello apareceu em campo fardado com gravata nas cores do Brasil.
Durante horas — antes de passar mal — se esticou para responder as perguntas formuladas pelos parlamentares que buscam apurar se houve falha ou omissão do governo federal no combate à pandemia.
Diferente de Enzo Pérez, que não precisou executar defesas tão difíceis, Pazuello foi provocado a explicar questões que ecoam na cabeça de milhões de brasileiros após mais um ano de pandemia. Por que o Brasil recusou ou ignorou tantas ofertas de vacinas por parte da norte-americana Pfizer? Por que insistiu (e ainda insiste) em recomendar um medicamento sem eficácia comprovada contra a covid? Por que demorou para agir na crise de oxigênio em Manaus?
E, tal como um arqueiro bem treinado, Pazuello respondeu aos questionamentos blindando não o gol, mas o presidente da República, Jair Bolsonaro. A coluna não cometerá a heresia de comparar Gallardo ao capitão, mas o fato é que o Palácio do Planalto escalou tropa de choque e treinou bem o ex-ministro, que chegou a dizer que nunca recebeu ordem direta do presidente a quem era subordinado. Mentira. Porque o próprio Pazuello foi autor da fatídica frase, em 2020: "aqui um manda e o outro obedece".
Pazuello pode não ter agradado senadores de oposição, mas fez sorrir a torcida de Bolsonaro. Cumpriu a tarefa que lhe foi dada pelo presidente e sua equipe. Eximiu o ex-chefe de qualquer culpa e rebateu as acusações feitas contra sua gestão no Ministério da Saúde. Questionado sobre o motivo de sua demissão, largou de pronto: "Missão cumprida".
A CPI também se aproximou do futebol em forma. Teve intervalo, xingamento entre os atletas e sugestão para contratação de uma agência de checagem (VAR). No segundo tempo da partida, Pazuello, tal como um jogador experiente que sabe que precisa ganhar o jogo, sentiu e precisou de atendimento médico. Minutos depois saiu pela lateral, caminhando como se nada tivesse acontecido. A partida estava ganha.
Ah, e o River de Gallardo venceu, como se sabe. E na próxima terça-feira vai enfrentar o Fluminense para confirmar a vaga nas oitavas de final na Copa Libertadores.