Hoje é 27 de janeiro de 2021. Há exatos oito anos, ocorria uma das maiores tragédias da história do Rio Grande do Sul: 242 pessoas morreram no incêndio da boate Kiss, em Santa Maria.
As chamas começaram por volta de 2h30min, durante uma festa que reunia principalmente jovens universitários. Naquela noite, nenhum pai ou mãe se despediu de um filho imaginando que ele jamais voltaria para casa.
Talvez você se lembre do que estava fazendo naquele domingo em que todos nós ficamos atônitos ao acompanhar as notícias. Eu morava em Brasília e, como repórter, liguei já no final da madrugada para os assessores da então presidente da República a fim de informá-la sobre a tragédia.
O primeiro assessor me botou os cachorros porque, de fato, nem sequer havia amanhecido. O que faria uma jornalista telefonar durante a madrugada? Horas depois, me pediria desculpas. Viu o tamanho da dor que estava apenas começando.
Eu não estive em Santa Maria. Mas meu amigo David Coimbra sim. E narrou numa coluna tão doce quanto dolorida a sua experiência naquele ginásio onde corpos de meninas e meninos sonhadores estavam enfileirados. Duvido que você não se emocione ao ler o relato aqui.
As famílias ainda choram — e quem não choraria? — principalmente pela ausência de um desfecho na Justiça. O julgamento, passados oito anos, ainda não ocorreu.
Os mesmos pais, que naquela noite não se despediram dos filhos com a potência que pede um último adeus, continuam ser conseguir assistir ao desfecho do devido processo judicial, tal como é esperado em um Estado Democrático de Direito. Por que a demora? Por que não conseguimos dar respostas a uma tragédia que comoveu um Estado e uma nação?
Oito anos depois e seguimos enterrando entes queridos, desta vez por conta de uma doença que se espalha sem pedir licença. Faltam respiradores, sobram notícias falsas. Falta oxigênio. Sobram desculpas esfarrapadas. E a gente aqui, rezando por que talvez também não tenhamos conseguido nos despedir de quem luta para sobreviver dentro de uma UTI.
Até quando?
O julgamento esperado pelos familiares não trará nenhum daqueles jovens cheios de vida de volta. Mas seria o mínimo que o Estado — aqui falamos do poder público — poderia dar como resposta aos seus cidadãos. Os mesmos pais que não conseguiram dar um último abraço nos filhos agora não conseguem dar adeus à tragédia, que insiste em não ter fim. O ano é novo. Mas os familiares de vítimas da boate Kiss vivem mais uma vez a espera por justiça.