Oito anos depois da madrugada de horror vivida em Santa Maria, famílias marcadas pela tragédia na boate Kiss seguem à espera de respostas. Previsto para ocorrer em Porto Alegre, o júri dos quatro réus no processo criminal que apura as circunstâncias do incêndio ainda não tem data definida. A expectativa é de que ocorra até o fim de 2021.
Inicialmente, o julgamento de Luciano Bonilha Leão, produtor da banda Gurizada Fandangueira, estava acertado para março de 2020, no município da Região Central. Os demais acusados, por solicitação de suas defesas, receberiam veredito em outro momento, na Capital.
A pedido da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia, o Ministério Público (MP) entrou com recurso para garantir que todos fossem sentenciados juntos, na cidade da Kiss. Sem êxito, o órgão passou então a requisitar julgamento único em Porto Alegre.
Com isso, em março de 2020, o júri de Bonilha Leão foi suspenso. Seis meses depois, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça atendeu ao requerimento do MP e, em dezembro passado, o processo foi distribuído para a 1ª Vara do Júri do Foro Central da Capital. Desde então, a marcação da data depende da definição de um juiz, já que a magistrada titular da vara assumirá nova função.
— Caberá ao juiz do processo decidir detalhes como local, data, se será durante a pandemia ou não. Vamos dar agilidade máxima para que isso se defina logo — promete a juíza-corregedora do Tribunal de Justiça do Estado, Vanessa Gastal de Magalhães (leia a entrevista completa).
Enquanto aguardam, os parentes dos jovens mortos na Kiss vivem dias de tristeza e aflição, como tem sido desde 27 de janeiro de 2013. Na última semana, a fachada da casa noturna recebeu um novo grafite, onde se lê: “Kiss, oito anos de impunidade.” Devido à covid-19, dessa vez, os atos organizados em memória das vítimas serão virtuais.
— Esperamos por justiça há oito anos. A gente vai sendo cada vez mais maltratado pela demora. Sofremos muito. Nesses oito anos, já perdemos vários familiares por doenças que foram aparecendo depois de tudo o que aconteceu — lamenta Flávio Silva, presidente da associação.
Além da revolta com as idas e vindas do processo, a entidade teme, agora, que o julgamento ocorra a portas fechadas em razão do coronavírus e por pressão de advogados de defesa.
— Esperamos que o júri saia este ano, mas não queremos que seja realizado sem a presença das famílias, em hipótese alguma. Precisamos estar presentes — reforça Silva.
A angústia é dividida com Lúcia Helena Callegari, uma das promotoras designadas para o caso. Titular da promotoria da 1º Vara do Júri, ela diz que o MP fará tudo o que estiver ao seu alcance para interceder em favor dos familiares.
— Estamos prontos para fazer o júri a qualquer momento e esperamos que não seja a portas fechadas, porque seria um desrespeito. Vamos pedir a condenação de todos os réus, com a esperança de que a sociedade de Porto Alegre faça justiça, porque a comunidade de Santa Maria merece. É uma espera longa demais — avalia a promotora.
Quem são os réus e qual é a acusação
- Os réus no processo criminal que apura as circunstâncias do incêndio na Boate Kiss são os sócios da casa noturna, Elissandro Callegaro Spohr, o Kiko, e Mauro Londero Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos (vocalista) e Luciano Augusto Bonilha Leão (ajudante).
- Os quatro respondem a ação penal por 242 homicídios e por 636 tentativas, com dolo eventual (quando se assume o risco de matar).