É difícil convencer alguém em sã consciência no Brasil a gostar de política. O atual presidente, eleito democraticamente com 57 milhões de votos em 2018, prometeu acabar com negociatas e escândalos que todos os anos fazem escorrer volumosas quantias de dinheiro público pelo ralo da corrupção. Como prova de seu empenho pelo combate aos malfeitos, escolheu a dedo e nomeou ministro da Justiça o personagem simbólico da luta anti-corrupção.
A falsa sintonia não durou muito. Ao primeiro sinal de investigação envolvendo seus familiares, trocou o comando da Polícia Federal e deixou o subordinado perplexo. O ex-juiz federal pediu as contas em nome da honra e de sua biografia, alegando que o chefe do Executivo se distanciava cada vez mais da conduta ética com a qual havia sido eleito.
E antes que apoiadores digam: mas e o Lula? Pois é exatamente disto que estamos tratando. Enquanto você grita pelo seu malvado favorito, mais um morre à espera de um respirador superfaturado - e que não foi entregue - em meio à pandemia de coronavírus.
Disse ontem o ministro Luis Roberto Barroso, em julgamento no STF sobre a soltura de um criminoso de altíssima periculosidade, algo que merece nossa reflexão: "Desviar dinheiro da saúde não é só corrupção, é algo que podemos classificar como próximo de um assassinato". E é.
Faço esse arrazoado inicial - perdão se me alonguei - para contar mais uma piada do anedotário político de Brasília. O vice-líder do governo Bolsonaro, senador Chico Rodrigues (DEM-RR), foi pego ontem pela Polícia Federal com dinheiro entre as nádegas. Para além de uma análise escatológica, o episódio diz muito sobre a descrença do brasileiro na política. Passa governo, entra governo, as práticas continuam as mesmas. Dinheiro escondido em mala, na cueca, entre as nádegas.
Como acreditar na transformação de um país que agoniza diante de uma pandemia com mais de 150 mil mortos diante de episódios como esse? Como acreditar em soluções possíveis para vencer desigualdades históricas, aprofundadas pelo coronavírus?
Difícil. Muito difícil. Ainda assim, continuamos. Porque não há luz na ausência de democracia e é ela, senhoras e senhores, quem nos permite escolher aqueles que seguirão nas Câmaras, Assembleias e neste Congresso Nacional, onde habita o senador que escondeu dinheiro em seu derrière. Oremos.
Para concluir, não carece de esforço lembrar que o palhaço mais votado do Congresso chegou até lá com a promessa, aos risos, de que pior do que estava não ficaria. A piada de mau gosto funcionou. Ele foi eleito. Mas a promessa não foi cumprida. As coisas continuam ruins, se não piores e nós é que pagamos a conta.