Não foi um simples ato de conduta baixa e mal educada executado nos corredores do Congresso Nacional. Foi racismo. E como tal deveria ter sido reprovado pelos demais 512 deputados que representam a população brasileira. A quebra de uma placa que integrava exposição em homenagem ao Dia da Consciência Negra na Câmara dos Deputados revela o quão distantes ainda estamos de nos tornarmos uma nação que respeita a cor da maioria de sua população.
O ato foi protagonizado pelo deputado federal Coronel Tadeu (PSL-SP) na véspera do Dia da Consciência Negra, celebrado nesta quarta-feira (20). A placa quebrada estampava uma charge do cartunista Latuff, que exibia um policial com uma arma deixando a cena após atirar em um jovem algemado.
E não se trata aqui de disparar críticas pessoais ao trabalho de centenas e milhares oliciais que também lutam por respeito e melhores condições de trabalho — e muitas vezes pagam com a própria vida ao defender a população nesta sociedade injusta, violenta e desigual. O que é imperativo neste episódio é promover uma leitura crítica sobre uma cruel realidade que deveria nos envergonhar todos os dias: no Brasil, as pessoas morrem, sim, por causa da cor da pele.
Basta observar os dados. Conforme levantamento do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 75,4% das vítimas mortas pelas polícias brasileiras eram negros. A constatação partiu de análise e investigação de 7.952 registros de intervenções policiais que resultaram em morte, entre 2017 e 2018. Os técnicos responsáveis pelo levantamento concluíram que esses números reforçam o racismo estrutural no país. "É Impossível negar o viés racial da violência no Brasil, a face mais evidente do racismo" disseram, à época.
Na mesma linha, o repórter Lucas Abati, da Rádio Gaúcha, informou em junho deste ano que o número de negros assassinados no Rio Grande do Sul praticamente dobrou entre os anos de 2007 e 2017, período analisado pelo Atlas da Violência divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Para efeitos de comparação, o aumento de morte de negros foi duas vezes maior em relação ao de brancos.
E muitos outros dados poderiam ser citados aqui. Basta folhear os jornais e acompanhar o noticiário todas as manhãs. Por esta razão, não podemos silenciar diante de um ato racista que parte de quem deveria ser responsável por elaborar leis e políticas públicas para ajudar na construção de uma sociedade melhor. Em pleno ano de 2019, Angela Davis se mostra cada vez mais necessária: na vida, como nas políticas públicas, não basta não ser racista, é necessário ser antirracista.