A lama pode virar arte? Marcelo Saraiva Bardaji, o Celo Pax, um dos mais expressivos artistas da cena urbana de Porto Alegre, prova que sim.
Na grande enchente de maio de 2024, a água barrenta do Guaíba invadiu o ateliê do criador, que é conhecido por “fabricar monstros”. Celo ficou 27 dias sem conseguir chegar perto do local de trabalho, no 4º Distrito, uma das regiões mais afetadas da cidade.
A água cobriu tudo: móveis, paredes e material de trabalho. Nem eles — os seres multicoloridos e cheios de dentes que você vê nas fotos da Camila Hermes — escaparam. Estivemos lá e vimos o estrago de perto.
— Quando consegui entrar no ateliê, quase desisti. Perdi 40 obras, entre telas, aquarelas e esculturas. Aos poucos, com a ajuda dos amigos, voltei, mas não está sendo fácil — diz o grafiteiro, que vive da arte há 15 anos.
Um conjunto de gravuras resistiu e agora renasce como manifesto. Quando a primavera chegar, Celo Pax promete uma nova exposição, e a série lambuzada de lodo estará presente. Ele não vai mudar nada.
De certa forma, a arte manchada de catástrofe é a tradução da emergência climática que vivemos. É um alerta que fala por si.
Com produção de Maria Clara Centeno.