Nenhuma mulher deseja abortar. Ninguém acorda pensando: “Que bom, hoje vou fazer um aborto”. A vida é o bem maior, e nós, em especial, sabemos disso, porque somos as responsáveis por gerá-la em nosso ventre. Interromper uma gravidez não é um passeio no parque, nem motivo de alegria e muito menos uma decisão fácil, mesmo nos casos extremos previstos em lei (estupro, risco de vida para a mãe e anencefalia do feto), ao contrário do que faz parecer o debate político torto que viceja no Brasil.
O que mais incomoda, nessa discussão, é a obsessão por punir e culpabilizar a mulher. Está claro: a culpa não é do homem que a violentou e engravidou à força. A culpa por rejeitar uma gestação fruto de abuso e violência é dela. Da vítima.
Se homens não cometessem atos do tipo, não seria necessário discutir o tal PL do Estupro, que penaliza a estuprada que aborta, mais do que o estuprador.
Também não haveria motivos para o PL em debate na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, que “sugere”, como mostrou a colunista Rosane de Oliveira, que a vítima de violência seja “convidada” a ouvir o coração do feto antes de optar pela interrupção.
A pergunta é: por que torturar a vítima e não discutir formas de coibir a violência sexual contra ela? Por que não ampliar as penas para estupradores? Por que impor mais sofrimento a quem deveria ser protegida?
A questão, aqui, não é ser contra ou a favor do aborto — volto a repetir, ninguém deseja um aborto. Erramos feio, como sociedade, ao permitir que, todos os dias, milhares de mulheres (e meninas!) sejam violentadas no Brasil. Dados oficiais indicam que, a cada minuto, em média, duas de nós são abusadas. E sabe do que mais? A maioria é de crianças menores de 15 anos. Poderia ser sua filha, sua neta, sua sobrinha.
Além de apertar o cerco contra os responsáveis pela atrocidade, deveríamos exigir educação sexual nas escolas, para que as vítimas compreendam que são exatamente isso: vítimas. E para que saibam como agir nesses casos. Mas, não, é mais fácil culpar as mulheres.