Ricardo Vilas: Canto de Liberdade
Conexão África, distribuição Tratore, R$ 25
Em meados de 1967, Zé Rodrix, Maurício Maestro, David Tygel e Ricardo Vilas, colegas no Colégio de Aplicação da UFRJ, formam o conjunto vocal Momento Quatro. Em outubro, acompanhando Edu Lobo, festejam a vitória de Ponteio no 3º Festival da MPB da TV Record. Dois anos depois, 7 de setembro de 1969, Ricardo Vilas, 19 anos, é um dos 16 presos políticos brasileiros trocados pelo embaixador dos EUA, sequestrado na luta contra a ditadura. Segunda-feira passada, no Teatro Maison de France, Rio de Janeiro, Vilas fez o show de lançamento de seu 27º disco, Canto de Liberdade, e gravou o segundo DVD, 50 Anos de Carreira.
O disco tem oito músicas dele, entremeadas por sete clássicos, o roteiro abrindo um leque que justifica o título; são canções de teor político, ou de protesto – e parece que esta palavra está voltando. “A ditadura passou, mas hoje nossa democracia sofre”, diz ele no texto de divulgação. “Vivemos de novo um momento de exceção, de desesperança.” Dos clássicos, nem preciso dar os autores: Apesar de Você (abre o álbum), Ponteio, Opinião, A Voz do Morro, Marcha da Quarta-feira de Cinzas, O Morro Não Tem Vez e Aquele Abraço. Entre as de Vilas, está o sucesso Estrela da Canção, já gravada por Ângela Maria e Simone.
Das seis inéditas, destaco Que Versos Posso Fazer (letra do ator e poeta Mário Lago), A Luta da Vida (letra do poeta angolano Filipe Zau) e Anjos (dedicada a Stuart Angel e sua mulher Sonia, torturados e assassinados pela polícia da ditadura). Os sambas de Vilas convivem com a tensão, caso de Circo do Horror, sobre a experiência na prisão, composta em Paris em 1972. Lembrando: banido do Brasil, ele foi para o México e depois obteve asilo na França, onde seguiu o trabalho de músico em parceria com a pernambucana Teca Calazans. Retornou com a anistia, em 1979, voltando a viver e atuar em Paris entre 1989 e 2008.
Mas o espaço é breve para contar a história de Ricardo Vilas. Ela está na rede. Falta dizer que ele canta muito bem, que os arranjos e músicos são muito bons, que as participações especiais de Nilze Carvalho, Marquinhos de Oswaldo Cruz e o angolano Marito Furtado são preciosas.
Sidney Miller, 50 anos depois
Argumento, de Joyce Moreno e Alfredo Del-Penho — Kuarup Música, R$ 25
Chega finalmente ao disco o show de Joyce Moreno e Alfredo Del-Penho cantando músicas de Sidney Miller (1945 – 1980), gravado ao vivo em 2012. Flashback: amiga de Sidney, Joyce foi convidada a revisitar as 12 músicas do primeiro álbum do compositor, dentro da série Grandes Discos, promovida pelo Instituto Moreira Salles. Lembrando da parceria de Sidney e Nara Leão, Joyce chamou para fazer o show com ela o cantor Del-Penho, então iniciando bela carreira no Rio. As vozes e violões dos dois (nada mais) processam um sentimento atual. Passados 51 anos, o conjunto de músicas impressiona. Na época dos festivais, Sidney era comparado a Chico Buarque pelas letras refinadas e as afinidades estéticas.
Lançado em 1967 pelo famoso selo Elenco, o primeiro LP saiu logo depois da apresentação no 3º Festival da Record, ao lado de Nara, com a música A Estrada e o Violeiro. Além desse, inclui os sucessos Marré-de-Cy, O Circo, Menina da Agulha e Pede Passagem. Mas há outras muito marcantes, como a que dá título ao álbum de Joyce e Del-Penho, Argumento. A letra termina assim: “Ouça bem o que eu lhe digo/ Vá cantar um samba antigo/ Pra entender o que há de novo”. Quatro músicas de outros álbuns (ele gravou apenas três) foram incluídas, entre elas É isso Aí (“Preparei uma roda de samba só pra ela/ Mas se ela não sambar/ Isso é problema dela...”).
Sidney Miller se suicidou em uma crise depressiva.
Antena
Monarco de Todos os Tempos, de Monarco
Único remanescente original da Velha Guarda da Portela, Monarco, 85 anos, tem uma história de vida que, como lembra o jornalista João Máximo em texto de divulgação do novo disco, “coincide com a das últimas sete décadas da história do samba”. Quando gravou o primeiro de seus quase 20 álbuns, em 1974, Monarco já integrava a ala de compositores da Portela havia 26 anos. Neste novo, em 16 sambas, vários em parceria com seu filho Mauro Diniz, estão reunidas composições de várias épocas, sendo a mais antiga de 1972, Alegria das Flores, gravada agora pela primeira vez – na época, Monarco ganhava a vida como guardador de carro nas ruas do Rio. Outras foram gravadas por intérpretes como Roberto Ribeiro, Beth Carvalho e Zeca Pagodinho. E algumas são inéditas. Ao lado do timaço de músicos liderados por Mauro (cavaquinista, produtor do disco), entre eles Rogério Caetano (violão 7) e Dirceu Leite (flauta, sax), a voz negra de Monarco se impõe com vigor e clareza, cantando principalmente as desilusões amorosas em sambas de espírito ancestral. Zeca Pagodinho e Alcione fazem participações especiais. Biscoito Fino, R$ 30,45.
40 Anos ao Vivo, de Nilze Carvalho
Aos 49 anos de idade, a cantora, compositora e instrumentista carioca está comemorando 40 anos de carreira – e até com atraso, pois tinha sete anos quando foi apresentada no programa Fantástico tocando cavaquinho como gente grande. Aos 12, lançou o primeiro disco, Choro de Menina; aos 15, fez a primeira turnê europeia; de 1992 a 1999, viveu no Japão, tocando em uma casa noturna. De volta ao Brasil, começa de fato a carreira por aqui, inicialmente integrando o grupo Sururu na Roda, onde tocava cavaquinho e bandolim. Em 2005 se assumiu como cantora, e eu penso que com a morte de Dona Ivone Lara, passa a ser dela o posto de maior sambista brasileira. O caleidoscópico novo álbum, gravado ao vivo no estúdio, é uma aula de samba. São 18 faixas em que ao lado de músicas próprias, como Verde, Amarelo, Negro, Anil, Nilze canta sambas de Monsueto, João Nogueira, Almir Guineto, Nei Lopes, Jorge Aragão, Dona Ivone, e canções como Kid Cavaquinho (João Bosco/Aldir Blanc) e Festa (Ivan Lins/Vitor Martins), apresentando ainda as instrumentais Barracão (Luiz Antonio), Feira de Mangaio (Sivuca) e Brasileirinho (Waldir Azevedo). Ótimos músicos a acompanham. Fina Flor, R$ 28.