"Um engano em bronze é um engano eterno". A frase está gravada numa placa em homenagem a Mario Quintana, na localidade de Alegrete, cidade natal do poeta. A sentença, escolhida por ele mesmo, demonstra sua contrariedade aos monumentos, estátuas ou tudo aquilo que pretende eternizar figuras históricas. Os monumentos são sempre uma tentativa de petrificação da história.
Uma estátua no meio de um parque se naturaliza a tal ponto que quase não faz sentido questioná-la. Faz parte da paisagem, mas muitas vezes esconde um passado violento e obscuro. Caso da estátua do bandeirante Borba Gato, que foi incendiada por manifestantes em São Paulo dias atrás.
A questão aqui não é por fogo ou não. Derrubar ou não derrubar. O que está em jogo aqui é pensar que tais símbolos materiais podem e devem ser contestados. A história não é uma construção estanque e acabada como se quer. A história é um processo, um percurso e em constante avaliação.
Além disso, estamos num outro tempo. Precisamos de uma história "a contrapelo", como sugeriu o pensador alemão Walter Benjamin. Uma história que seja contada por uma outra ótica. Não ótica dos bandeirantes, dos ditadores, dos mercadores de escravos, mas do escravizados, dos colonizados e de todos aqueles que sofreram com processo violento da globalização e do capitalismo.
Os símbolos da história devem ser revistos. Ora, por que não questionar o hino rio-grandense, que faz referências racistas? E por que não modificá-lo? Por que não trocar o nome de avenidas que carregam homenagens a ditadores? Ou rever os nossos símbolos, como, por exemplo, a própria estátua do Laçador, e pensar o quanto esse monumento de fato representa o povo gaúcho?
Vejam, não significa colocar tudo abaixo, mas problematizar nosso passado. Temos dois grandes temas muito mal resolvidos no Brasil: a escravidão e a ditadura. Portanto, aceitar um monumento, uma placa ou uma estátua como a única verdade sobre o passado significa diminuir nossa própria história.
E como diria Mario Quintana: um erro em bronze pode ser um erro eterno.