“Todos bandidos”, declaração do vice-presidente Hamilton Mourão, referindo-se à chacina da favela do Jacarezinho, é tão nefasta e atroz que só confirma a visão determinista que o Estado lança sobre as periferias.
É a mesma lógica do “Se foi abordado pela polícia e é preto, é claro que é bandido” ou “Se morreu, só podia ser criminoso”. A declaração de Mourão é irresponsável e comprova que a pena de morte no Brasil já existe há muito tempo, mas só quem morre são pretos, pobres e favelados. Prender e julgar suspeitos deu lugar às execuções sumárias permitidas pelo Estado. Vinte e oito mortes não foi um confronto. Foi um massacre.
Além disso, a declaração do delegado Rodrigo Oliveira, ao dizer que o Brasil vive um “ativismo judicial”, é um claro ataque ao STF, que havia proibido operações nas favelas durante a pandemia. Matar primeiro e identificar depois é uma conduta inaceitável. Segundo o jornal El País do último dia 7 de maio, 13 mortos, dos 28, não eram investigados pela polícia. Na sexta-feira, a Polícia Civil do Rio divulgou a lista dos mortos dizendo que todos estavam envolvidos com o tráfico, mas não deu mais detalhes das fichas criminais.
Independentemente se eram ou não criminosos, há muitas questões a serem respondidas: que projeto de segurança é esse que põe em risco a vida de policiais, moradores e crianças? Que inteligência é essa da polícia que não trabalha com a prevenção, com a interceptação de armas e drogas? Que inteligência é essa que não chega nos grandes chefes do tráfico? — já que se sabe que na favela não se produz drogas nem armas. Que projeto de segurança é esse que não oferece alternativas a jovens aliciados pelo crime?
Sou carioca, morei no Rio durante minha adolescência e sinto uma profunda tristeza ao ver tamanha violência. O massacre ganhou os noticiários internacionais. A ONU solicitou uma investigação independente ao Ministério Público. E mais uma vez corpos negros são alvos de um massacre. Assassinar pessoas não pode ser uma política de segurança pública.