A publicação de um poema, em 1939, pelo poeta martinicano Aimé Césaire, marca o início das discussões sobre as lutas pela igualdade racial e a consciência negra. Assim surge a negritude, um movimento social e intelectual que pretendia restabelecer a dignidade do mundo negro e efetivar a valorização da cultura negra.
De lá para cá, houve avanços. Entraram em nossa gramática cotidiana expressões como: “racismo estrutural”, “lugar de fala” e “branquitude”. Movimentos como Vidas Negras Importam também ganharam força. No entanto, ainda precisamos sair do nível discursivo e ir para a prática.
Há poucos dias, tivemos o lançamento da Enciclopédia Negra, uma obra importante para a cultura brasileira, organizada por Flávio dos Santos Gomes, Jaime Lauriano e Lilia Schwarcz. Publicado pela Companhia das Letras, o livro traz a público 416 verbetes e a vida de mais de 550 pessoas negras das mais distintas atividades sociais. Trata-se, pois, de um projeto concreto e de grande envergadura na luta antirracista.
A Enciclopédia Negra é um marco para a cultura brasileira e uma reparação histórica, sobretudo porque restitui a importância de vidas negras invisibilizadas pelo racismo, passando por nomes como Marielle Franco, Lima Barreto, Luiza Mahin e Madame Satã, além de reafirmar a negritude de personalidades embranquecidas pelo sistema racista, como foram os casos de Machado de Assis e Mário de Andrade.
As reparações históricas não podem parar. As cotas raciais nas universidades devem ser ampliadas. As diferenças salariais entre negros e brancos devem ser equiparadas, assim como a representatividade e a naturalização de negros e negras em espaços de decisão.
Por anos, homens e mulheres negras sofreram com a violência do apagamento. Vivemos ainda em um país que exalta a contribuição europeia, mas que silencia diante da contribuição negra. Se estamos rodeados por heróis, estátuas e monumentos que representam a barbárie, a colonização e a violação de direitos, é também necessário erguer outros monumentos que sirvam de contraponto ao discurso colonial opressor. Enciclopédia Negra, seja bem-vinda.