Na semana passada, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou nomeações relacionadas a um concurso para servidores da prefeitura de Capão Bonito do Sul, na Serra. Detalhe: o certame aconteceu em 2011. As irregularidades foram objeto de reportagem do Grupo de Investigação da RBS (GDI) e resultaram no afastamento de quatro funcionários beneficiados por alteração nas notas das provas (outros dois saíram nos últimos anos).
O tempo transcorrido entre o concurso e sua anulação definitiva dá uma ideia de como é complexa a tarefa de comprovar fraudes na administração pública, ressalta o promotor de Justiça Mauro Rockenbach, o mais experiente no combate a irregularidades desse tipo. Ligado à Promotoria de Justiça Especializada Criminal de Porto Alegre, ele encabeçou pelo menos quatro investigações sobre ilegalidades na escolha de servidores públicos municipais: a Operação Gabarito (iniciada em 2008, com denúncias a partir do ano seguinte), a Operação Missioneira (iniciada em 2012), a Operação Cobertura (iniciada em 2015) e a Operação Garantia (iniciada em 2018).
As três primeiras, para investigar empresas que escolhiam determinadas pessoas para passarem em concursos. Já a Garantia foi para apurar fraude na contratação de uma empresa específica para aplicação de concurso público, em detrimento de outras.
E quantas pessoas entraram na mira por supostas fraudes, nesses casos? Milhares, mas 397 acabaram denunciadas, conforme levantamento feito pelo Ministério Público, a pedido deste colunista. As investigações, transcorridas em 15 anos, atingiram um em cada cinco municípios gaúchos. Tanto em concursos para funcionários de prefeituras como para Câmaras de Vereadores. A fraude mais comum é a indicação de "favoritos" para ocuparem as vagas. Para isso, empresas organizadoras das provas concordam em trocar a colocação dos aprovados no ranking. No caso de Capão Bonito do Sul, por exemplo, um candidato aprovado em 8º lugar foi remanejado para 1º lugar, sem qualquer motivo — a pedido de uma funcionária graduada da prefeitura. Isso ficou comprovado em e-mail no qual ela pede ao organizador do concurso que beneficie uma lista de candidatos, o que resultou em prejuízo a outros.
Só que muitos casos acabam sem punição. Via de regra, o ritmo de julgamentos não acompanha o das investigações. Dos 397 casos, só 71 resultaram em condenações definitivas. Os demais prescreveram por excesso de prazo na tramitação, resultaram em absolvição ou ainda não foram julgados.
Perguntado sobre a morosidade em alguns processos com mais de 10 anos de tramitação, o promotor Rockenbach diz que quem deve opinar é o Judiciário, que tem o controle dos prazos processuais.
Como estão os casos
Gabarito
- 134 denunciados
- 97 condenados — 26 deles com penas prescritas por excesso de prazo
Missioneira
- 9 denunciados
- 9 condenados — tiveram pena prescrita por excesso de prazo.
Cobertura
- 206 denunciados
- 11 condenados — oito foram absolvidos em segundo grau ou a pena prescreveu. Nos demais, há recursos
Garantia
- 48 denunciados
- 31 processos continuam em tramitação
- 17 foram absolvidos e os demais não tiveram julgamento
Fonte: Ministério Público/RS