Informamos recentemente na coluna que há previsão de deslocamento de 150 militares gaúchos para a fronteira com a Guiana, ainda em maio. Mas essa não é a única missão militar do Rio Grande do Sul na região Norte do país. Em agosto outro contingente deve embarcar, para outro ponto quente: a fronteira com a Venezuela.
O efetivo que irá em agosto fará parte da Operação Acolhida, que é realizada há anos em Roraima, com objetivo de ajudar refugiados venezuelanos que saem de seu país por motivos políticos ou econômicos (daí o nome da ação). No segundo semestre de 2024 irão para Pacaraima, cidade roraimense na fronteira venezuelana, mais de 450 militares do Sul do Brasil, em sua maioria, gaúchos. São 358 do Exército, 70 da Marinha e 35 da Força Aérea (FAB), informa o chefe do Comando Militar do Sul (CMS), general Hertz Pires do Nascimento. Ele pessoalmente deve embarcar junto com essa tropa, que permanecerá em Roraima de 14 de agosto deste ano a 14 de janeiro de 2025. As tropas serão de unidades variadas (infantaria, engenharia, logística), mas subordinadas à 3ª Divisão de Exército, com sede em Santa Maria.
A Operação Acolhida foi criada em 2018 e desde então 950 mil pessoas entraram no Brasil por Roraima, a maioria venezuelanas. Elas são triadas e recebidas em acampamentos militares, onde recebem alimentação, vacinas e kits de higiene, antes de buscarem ajuda para migrar internamente rumo a outras regiões brasileiras. Mais de 8 mil militares brasileiros, de diversas unidades, participaram dessa iniciativa nesses últimos seis anos. Em média, ainda ingressam em território brasileiro 400 venezuelanos por dia, informa Hertz, a maioria via Pacaraima.
O general Hertz também é o chefe do contingente de 150 gaúchos da Cavalaria Mecanizada que vai reforçar o patrulhamento em outro ponto de Roraima, a fronteira com a Guiana. A decisão de aumentar a presença militar brasileira na região Norte do país ocorre desde que, meses atrás, a Venezuela ameaçou tomar uma parte do território guianense, a província de Essequibo, rica em petróleo e disputada historicamente pelos dois países. Como a tensão cresceu, o Ministério da Defesa brasileiro incrementou a presença bélica naquela área. Novas tropas vão reforçar a Primeira Brigada de Infantaria da Selva, de Roraima.
A tropa escolhida para atuar junto à Guiana, a partir de 28 de maio, é formada por efetivos do 12º Regimento de Cavalaria Mecanizada (RcMec, de Jaguarão), do 3º RCMec (de Bagé) e do 7º RCMec (de Santana do Livramento). Apesar do nome, essas unidades não lidam com cavalos e, sim, com carros de combate. Já estão na fronteira com a Guiana 14 viaturas blindadas multitarefa (VBMT) 4x4 Guaicurus (equipadas com sistemas de armas remotamente controlados, meios de visão termal e módulos de comando e controle), além de oito viaturas blindadas de transporte de pessoal médio sobre rodas Guarani (com canhão e metralhadora), seis viaturas blindadas de reconhecimento média sobre rodas EE-9 Cascavel (com canhão e metralhadora), e algumas viaturas administrativas. Elas serão agora utilizadas por gaúchos e não está descartado um incremento no número de blindados (o Rio Grande do Sul concentra o maior contingente de blindados da América do Sul).
O deslocamento de tropas e equipamentos militares para Roraima teve início após a escalada de tensões entre Venezuela e Guiana causada pela disputa pelo território de Essequibo. Alvo de uma controvérsia que remonta ao século 19, esse território voltou a ser reclamado pelo governo da Venezuela no ano passado. Em dezembro passado, os eleitores venezuelanos aprovaram, em referendo, a incorporação de Essequibo, que soma 75% da atual Guiana e é rico em petróleo.
Há uma chance de que a Missão Roraima (como é chamada essa força que irá à fronteira com território guianense) não conte com os gaúchos e se limite ao uso de tropas do Norte. Isso porque a tensão diminuiu nos últimos meses, especialmente após a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Guiana, como mediador para evitar conflito. Só que o ano é eleitoral na Venezuela, e a qualquer momento o presidente venezuelano Nicolás Maduro pode reavivar as brasas da disputa com os guianenses, o que justificaria o envio de tropas brasileiras para amortecer a tensão.
Na realidade, o envio de tropas é uma forma de dissuasão. Algo do tipo "não mexa com meu vizinho, que ele é meu amigo". Claro que você não ouvirá isso oficialmente nas Forças Armadas brasileiras. A palavra de ordem é distensionar.