Uma pesquisa realizada pela Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, tirou a temperatura da magistratura do RS sobre vários temas criminais. São assuntos polêmicos, como alternativas à prisão preventiva, pena de morte, redução da maioridade penal, controle de redes sociais e ataques ao Estado Democrático de Direito, entre outros.
A enquete ouviu 95 magistrados que atuam ou atuaram na área criminal e mostra, nos resultados, que os entrevistados esboçam, via de regra, um perfil mais liberal do que conservador. Temas como pena de morte ou rebaixamento da maioridade penal são repudiados. Em contrapartida, a maioria considera que o controle das redes sociais e das atividades policiais (via câmeras corporais) é necessário.
Esses são apenas alguns dos temas abordados pela pesquisa, intitulada "Dilemas da Justiça Penal para a Magistratura Gaúcha". O estudo foi coordenado pelo sociólogo Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo, professor da Escola de Direito da PUCRS. Dos 844 magistrados de todos os níveis que atuam no Judiciário gaúcho, 95 responderam (os da área criminal).
O questionário foi online. O entrevistado poderia se posicionar sobre cada tema em uma escala de 1 a 10, onde 1 representa total discordância, e 10 total concordância.
Veja os principais resultados
Confira as respostas a outros temas
Alternativas à prisão preventiva
A maioria dos magistrados gaúchos se opõe à proposta de obrigatoriedade de manutenção da prisão preventiva somente levando em conta o delito praticado.
- 60% dos entrevistados respondeu que discorda da necessidade de prisão preventiva durante todo o processo judicial, mesmo quando ocorrem crimes com violência grave. Entendem que cada caso deve ser analisado.
- 20,2% concordam com a obrigatoriedade da prisão nesses casos.
Medidas cautelares diversas da prisão
- 37,2% concorda que medidas cautelares diversas da prisão (proibição de viagens, confisco de passaportes, se apresentar ao juiz) são mecanismos adequados e suficientes para garantir a efetividade do processo. Não sendo necessário, em grande parte dos casos, decretar a prisão preventiva.
- 8,5% discordam totalmente.
Controle de redes sociais
- 37,2% concorda que um dos deveres do Judiciário é retirar conteúdo potencialmente ilícito divulgado em redes sociais e responsabilizar criminalmente seus autores.
- 8,5% discordam dessa missão.
Câmeras corporais para policiais
- A maioria absoluta dos magistrados ouvidos (73,4%) considera adequado o uso de câmeras corporais no uniforme dos policiais.
- 6,3% discordam.
Segregação de líderes de facções
- 69,1% se declaram favoráveis a medidas excepcionais para líderes de facções criminosas, como transferência para presídios federais de segurança máxima e regime disciplinar diferenciado.
- 4,2% discordam.
Audiências de custódia
- 25,5% concordam que a implantação da obrigatoriedade das audiências de custódia contribuiu para um maior controle sobre a violência policial e um juízo mais seguro sobre a necessidade da conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Essas sessões decidem se alguém irá para um presídio ou não.
- 17% dos que responderam discordam.
Juiz de garantias
A adoção do juiz de garantias (que só instrui o processo, mas não o julga) divide opiniões.
- 40,4% dos entrevistados discordam que a medida dê mais lisura ao processo penal.
- 23,4% se mostram favoráveis à medida.
Envolvidos analisam os resultados
A coluna conversou com os responsáveis pelo estudo. Rodrigo Azevedo, que coordenou a pesquisa, acredita que as maiores divergências refletem, em alguma medida, uma polarização social que transcende o Poder Judiciário:
— Estão relacionadas com o debate mais amplo sobre a crise do Estado de direito e de seus mecanismos tradicionais de controle do crime. A questão é particularmente impactante no que diz respeito ao problema do mercado ilegal de drogas, com todas as questões que envolve, em termos de saúde pública e de ingresso no mundo do crime de contingentes importantes da população, além do aumento do poderio de grupos criminais que dominam territórios e interferem na vida cotidiana de muitos cidadãos e interferem no próprio sistema político e de segurança pública.
Já o presidente da Ajuris, Cristiano Vilhalba Flores, ressalta o ineditismo do estudo na área penal:
— Um universo que sempre terá a atenção da Ajuris, para ajudar a sociedade em questões relevantes. A pesquisa, realizada com parcela significativa de juízes e desembargadores gaúchos, mapeou tendências em questões que afetam o dia a dia, como o funcionamento das audiências de custódia, a adoção de medidas cautelares, a criação da figura do juiz de garantias, a questão das drogas, o combate à violência contra a mulher e o uso de câmeras nos uniformes dos policiais, entre outros.