Começa nesta semana o interrogatório dos 14 réus de um dos mais rumorosos casos de desvios de financiamentos ocorridos no Brasil. Os acusados respondem nos planos cível e criminal por se apropriar de mais de R$ 10 milhões em verbas federais destinadas pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) a agricultores gaúchos. O processo penal corre na 7ª Vara da Justiça Federal de Porto Alegre, embora os supostos crimes tenham sido cometidos no Vale do Rio Pardo (Santa Cruz do Sul e região).
A investigação foi concluída pela Polícia Federal em 2014. Seis dos réus são ligados à Associação dos Pequenos Agricultores Camponeses (Aspac), um braço do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). A entidade intermediou o repasse de R$ 178 milhões do Pronaf a agricultores. Só que, em vários casos, os empréstimos foram tirados duas vezes em nome da mesma pessoa – e parte do valor ia para as contas de integrantes da Aspac, segundo a investigação da PF. O esquema teria conluio de oito funcionários do Banco do Brasil, que autorizavam os financiamentos. Eles também viraram réus. Pelo menos R$ 10 milhões teriam ido para contas de dirigentes da Aspac, embora o valor possa ser maior. O cálculo é que 6,3 mil agricultores possam ter sido prejudicados, informa Ricardo Hermany, advogado que atua como assistente de acusação no processo criminal.
A denúncia relativa ao caso foi feita pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2019. No mesmo ano, os 14 denunciados viraram réus. Os defensores deles pediram absolvição sumária, alegando suspeição do magistrado e incompetência da Justiça Federal para julgá-los. O juiz Guilherme Beltrami, da 7ª Vara Federal de Porto Alegre, rejeitou os pedidos.
Em 2022 e 2023 foram ouvidas mais de cem testemunhas iniciando pelas arroladas pela acusação e depois pelas defesas. A partir desta segunda-feira (26) deve começar o interrogatório dos acusados por parte do magistrado. As sessões acontecem presencialmente (na 7ª Vara Federal) ou por videoconferência, com alguns interrogatórios em Santa Cruz do Sul.
Existem também processos cíveis tramitando. Mais de 500 ações reivindicam indenização, a ser paga por parte dos denunciados. Elas só podem ser ajuizadas até o próximo ano, sob pena de prescrição. Vários agricultores já receberam o pagamento das indenizações. Todos os acusados alegam inocência. O grupo ligado à Aspac diz que apenas intermediava os contratos, sem fraude. Os servidores do Banco do Brasil afirmam que só autorizaram financiamento a quem tinha capacidade de suportar endividamento.