Neste Grande Irmão futurizado por George Orwell, as câmeras estão por todo o lado. E filmaram a tragédia em Foz do Iguaçu (PR) na noite de sábado (9), um quase duelo. De um lado um agente penal bolsonarista, que entrou numa festa de aniversário sem ser convidado, armado e disposto a tirar satisfações. De outro o aniversariante, um guarda municipal, conhecido político petista daquela cidade paranaense, que tinha sido ameaçado minutos antes pelo penetra. Temendo ser agredido, ele também conseguiu uma arma. O resultado foi um tiroteio em que ambos foram baleados.
O petista, Marcelo Arruda, agonizou até a morte em plena festa. O bolsonarista, José Guaranho, levou vários tiros e, caído no chão, foi chutado pelos amigos do aniversariante. Está hospitalizado em estado grave. Uma terceira participante, a mulher de Arruda, é policial civil e também estava armada. Tentou prender o invasor, que reagiu.
Os defensores do homem que entrou na festa provavelmente alegarão legítima defesa, com base no fato de ter ocorrido troca de tiros entre ele e a vítima. Só que o invasor foi ele e isso será levado em conta pela Justiça.
Seria precipitado atribuir ao afrouxamento das regras para compra de armamentos o resultado deste episódio em particular. Ao que se sabe, todos os envolvidos são servidores públicos da segurança e tinham permissão para uso de armas. Ou seja, a tragédia poderia ter acontecido antes dos decretos de Jair Bolsonaro que permitiram ao cidadão adquirir mais armas.
A questão que se coloca é: se entre servidores públicos esse risco de discussão sangrenta acontece, imaginem entre cidadãos comuns, que costumam ser menos preparados.
O que aconteceu em Foz do Iguaçu é a fagulha num estopim que vem sendo armado há muito tempo, numa campanha presidencial que se avizinha como a mais agressiva já vista em muitas décadas. Basta lembrar alguns episódios recentes de intolerância:
— Bomba caseira recheada de fezes jogada contra o público num ato pró-Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Rio de Janeiro.
— Protesto de militantes de esquerda impede palestra de políticos do Partido Novo na Universidade de Campinas (SP).
— Drone despeja fezes líquidas sobre petistas num comício em Uberlândia (MG).
— Carro do juiz que mandou prender um ex-ministro da Educação bolsonarista é atingido por fezes, ovos e terra, em Brasília.
— Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) cancelam várias palestras na Serra gaúcha após receberem diversas ameaças.
Bom lembrar que o próprio Jair Bolsonaro, quando ainda era apenas candidato ao Planalto, foi atingido por uma facada desferida por um adversário que teve passagens por dois partidos de esquerda. O homem foi preso e as investigações não conseguiram comprovar a existência de um complô, apesar da convicção do presidente nesse sentido.
Ainda é tempo de evitar mais casos como o de Foz do Iguaçu. Basta que as lideranças políticas desestimulem a violência. Difícil, mas não impossível.