A violência no Congo diminuiu em abrangência, mas aumentou em crueldade. Essa é a constatação do general brasileiro Carlos Alberto dos Santos Cruz, que retornou há pouco daquele país africano, onde supervisionou inspeção da ONU na região mais afetada por rebeldes e banditismo.
Santos Cruz comandou na República Democrática do Congo, entre 2013 e 2015, mais de 25 mil militares da Missão de Paz das Nações Unidas, na maior missão da história da ONU. Retornou em dezembro, a pedido do Departamento de Operações de Paz, para realizar uma análise dos problemas ainda existentes. Em seu relatório, apresentado na última terça-feira (21) em Nova York ao secretário-geral da ONU, António Guterres, o general da reserva (gaúcho de Rio Grande) recomenda um plano de ação para combater ataques a civis na área de Beni, na província de Kivu Norte.
Somente nos meses de novembro e dezembro de 2019, mais de 260 civis foram mortos em Kivu Norte. Os ataques foram perpetrados por supostos combatentes do grupo rebelde Forças Democráticas Aliadas (ADF), de origem muçulmana, mas que com o tempo aderiu também à prática de crimes comuns, descreve Santos Cruz.
—Eles usaram requintes de crueldade, inclusive com crianças pequenas mortas com facões e machados. Uma coisa bárbara. Então, o que acontece no Congo não é uma escalada, é uma questão de contenção desse grupo, que é uma mistura de fundamentalismo com grupo armado e crime organizado também — descreve Santos Cruz, que relatou a GaúchaZH os principais pontos de seu informe à ONU.
O alto número de vítimas civis no Kivu do Norte provocou protestos violentos contra a Missão de Paz, inclusive destruição e saques de um escritório da missão da ONU em Beni, em 25 de novembro.
A ADF atua na fronteira do Congo com Uganda e por isso, ressalta Santos Cruz, o problema não é puramente congolês.
— A participação de Uganda para ajudar na contenção da ADF também é importante. Os problemas ali naquela linha de fronteira sempre envolvem no mínimo um entendimento entre os dois países para combater o grupo armado.
A ação da ADF foi represália à retomada de porções do território congolês por parte do exército daquele país, com apoio da ONU. Santos Cruz sugere intensificação de operações militares conjuntas com o exército congolês, com apoio das tropas das Nações Unidas. Diferentemente de outras missões de paz, nesta a ONU conta com uma Brigada de Intervenção que inclusive participa ativamente de combates, quando atacada.
Ele acredita que, mais do que militar, é preciso ação policial constante na fronteira, porque os grupos armados atuam mais com banditismo do que com política.
— Falta presença do Estado e sobram grupos que se comportam como crime organizado. Eles não têm nenhum objetivo político, têm um interesse de exploração da população local, extorsão, controlar o comércio ilegal na fronteira. E isso aí só a presença governamental mesmo que pode solucionar.
Santos Cruz ressalta que as Nações Unidas não estão no Congo inteiro porque é impossível, praticamente toda a Europa cabe dentro daquele país africano.
Um problema que será agora de outro general brasileiro, Ricardo Augusto Costa Neves. Ele acaba de assumir o controle militar da Missão das Nações Unidas no Congo.