O dia começou com enxurrada de desabafos de policiais, nas mídias sociais e nos e-mails de jornalistas. Choram a morte de mais um colega, o soldado Gustavo de Azevedo Barbosa Júnior, assassinado por criminosos que tinham roubado um carro e reagiram à abordagem feita pelos PMs.
Várias dessas mensagens reclamam da falta de treinamento a que os novos policiais, militares e civis, são submetidos. Não é o caso agora de analisar o episódio específico desta morte, até porque faltam elementos. É certo que Júnior agiu ao perceber, junto com o colega de patrulhamento, que o carro visado era roubado. Morreu na defesa da sociedade, em resumo.
Mas o que preocupa é que esse é o quinto policial assassinado este ano e só temos um semestre transcorrido. Em meados da década a situação já foi bem mais preocupante: 11 mortos em 2015 e outros 11 em 2016. A grande diferença é que as mortes atingiam, sobretudo, policiais de folga. Dos 11 mortos em 2015, por exemplo, dois estavam de patrulha, os demais estavam em "bicos" (serviços particulares de vigilância) ou de folga.
Em 2019, ao contrário de anos anteriores, a maioria dos mortos (quatro dos cinco) estava em serviço. Algumas pessoas enviaram e-mail perguntando a este colunista se é falta de treinamento. Lembraram que em 2018 ocorreu a morte de um policial civil durante um cerco a dois marginais e todos os indícios são de que o tiro fatal partiu de colegas do agente, conforme analisou a própria juíza responsável por julgar o caso. Ela arquivou o processo a respeito, por entender que os bandidos também foram, em última instância, agentes causadores do fato.
Ouvimos três experientes policiais e vamos a alguns fatos sobre treinamento:
— A preparação dos PMs no Rio Grande do Sul hoje leva oito meses. Já foi maior, de 10 meses (em 1990) ou de nove meses (em 2016), agora diminuiu. Mas também já foi bem menos intenso: em 2009 policiais foram formados em seis meses, no governo Yeda Crusius — que, aliás, foi um dos que mais PMs concursou, mesmo que formados de maneira ultrarrápida.
— Alguns Estados brasileiros mantém cursos de 12 meses para formar PMs. É o caso do vizinho Santa Catarina e de Pernambuco, informa o sargento Leonel Lucas, PM gaúcho que preside a Associação Nacional de Entidades Representativas de Policiais Militares e Bombeiros Militares (Anermb).
— Policiais deveriam sofrer reciclagem de treinos a cada dois anos, conforme recomendações internacionais, salienta Lucas. "O RS já teve intervalos de quatro anos sem que PMs voltassem a um estande de tiro, agora a reciclagem voltou", diz o presidente da Anermb.
— No episódio da madrugada passada, pelos fatos descritos na ocorrência policial, os PMs que abordaram os criminosos estavam em inferioridade numérica. Eram dois policiais e, no veículo roubado, estavam três ladrões.
A realidade é que os brigadianos que atuaram no caso da última madrugada tiveram um gesto heroico, mas que não seguiu procedimentos-padrões internacionais de policiamento: para conter criminosos é necessário supremacia de força e efetivo, o que diminui o risco. Por isso, a recomendação passada pelos especialistas ouvidos pela coluna é treino, treino e mais treino.