O vice-presidente Hamilton Mourão e o ministro da Secretaria de Governo, Santos Cruz, ambos generais, não desejam continuar em público um bate-boca com outros setores que apoiam o presidente Jair Bolsonaro. Coube então ao decano dentre os militares no governo, general Eduardo Villas-Bôas, manifestar o desagrado por parte dos oriundos da caserna com os ataques sistemáticos que recebem do pensador Olavo de Carvalho. Nem foi preciso pedir, ele simplesmente se solidarizou aos colegas de farda e disse que Olavo é uma espécie de Trotski da direita: um franco-atirador que desestabiliza o governo.
É que Olavo, guru da família Bolsonaro, simplesmente chamou Santos Cruz de "bosta" dias atrás, pelo Twitter. Nem seus fieis seguidores aceitaram bem isso, basta ver as respostas tuitadas. As críticas quase unânimes vão a Olavo e não ao general, o mais bem-sucedido militar brasileiro em incursões internacionais.
Santos Cruz é um ícone entre os fardados. Foi comandante militar no Haiti e, após ir para a reserva, foi chamado novamente pela ONU para comandar 29 mil militares da Missão de Imposição de Paz no Congo, país assolado pela guerra civil. Ele liderou o maior contingente de "capacetes azuis" da história. Desde então, mesmo no governo já foi chamado para ensinar a outros generais, mundo afora, como se comanda tropas das Nações Unidas. Deu cursos em Bangladesh, no Quênia e no Uruguai nos últimos meses.
É com um homem assim que Olavo resolveu comprar briga. Mais que isso: em tuíte disparado nesta terça-feira (7), o pensador, radicado nos EUA, desdenha do general Villas Bôas e o chama de "doente preso a uma cadeira de rodas".
Mas o que está por trás dos ataques de Olavo e seus discípulos (entre eles um dos filhos do presidente, Carlos) aos militares que integram o governo? Em primeiro lugar, diferenças ideológicas. Os militares, pragmáticos, não querem ousadias em diplomacia externa. Repudiam intervenção estrangeira na Venezuela, querem manter bons laços com a China e equilíbrio na delicada relação do Brasil com árabes e judeus. Já os olavistas se alinham com Israel (na disputa com os palestinos), pressionam por uma saída militar para o impasse venezuelano e defendem rigor com os chineses, a quem consideram imperialistas.
A disputa pelo controle ideológico no governo passa, óbvio, por verbas. Sobretudo de publicidade. Santos Cruz está na mira dos olavistas porque o ministério dele controla a Secretaria de Comunicação (Secom) e suas gordas verbas (orçamento de R$ 150 milhões este ano). Foi essa secretaria que vetou, dias atrás, um comercial do Banco do Brasil que primava pela diversidade racial e sexual. Santos Cruz afirmou que não cabia o veto da Secom à propaganda de estatais. Soou aos olavistas como defesa do comercial vetado - embora o general não tenha sido explícito.
O bate-rebate entre olavistas e militares, todos de direita, tem um nítido componente: quem vai se assenhorar da mensagem a ser passada pelos novos donos do poder aos brasileiros?