A jornalista Carolina Pastl colabora com a colunista Gisele Loeblein, titular deste espaço.
A marca de doce de leite Estrelat, de Estrela, é uma das 22 agroindústrias familiares que encherão, nesta sexta-feira (17), um caminhão de produtos lácteos com destino a quatro Estados brasileiros no final de semana. A venda, coordenada pela Associação Gaúcha de Laticinistas (AGL), em parceria com a empresa mineira Biotech, é a primeira depois da medida emergencial adotada pelo Ministério na quarta-feira (15). Pela portaria, as agroindústrias gaúchas passam a poder comercializar, por 90 dias, produtos de origem animal para outros Estados. O objetivo é, justamente, amenizar prejuízos econômicos no campo trazidos pelas enchentes.
Da agroindústria do Vale do Taquari, região que mais uma vez foi afetada pelas cheias, serão quase 500 vidros de doce de leite. Ao todo, 3,5 toneladas de lácteos serão levadas na carreta do veículo, que sai de Gravataí, na Região Metropolitana, para Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Minas Gerais.
Para o dono da Estrelat, Roberto Oliveira, essa primeira venda é "uma luz no fim do túnel". Ainda que a propriedade rural não tenha sido afetada — "ainda bem", suspira —, o negócio foi. Mais de 90% do faturamento do estabelecimento vêm de feiras.
— Só em maio, tínhamos 12. Mas todas foram canceladas. Nossa receita está zerada, e o estoque, alto, com quase 3 mil vidros de doce de leite — acrescenta o produtor.
De acordo com um levantamento feito pela AGL em meio à tragédia climática no Estado, esse é principal gargalo das agroindústrias de produtos lácteos no momento: a comercialização. Os 35 estabelecimentos entrevistados estimam perdas no faturamento que variam de 50% a 90% para maio, junho e julho.
— Sem contar que, no setor lácteo, é ainda mais delicada a questão de estoque. É um produto perecível, não dá para ficar muito tempo guardado. Não tem também como a vaca não dar leite. Tem que ordenhar — afirma Danilo Gomes, diretor técnico da AGL.
Das quase 1,8 mil agroindústrias formalizadas no Estado, cerca de 400 delas são de laticínios. No entanto, além do lácteo, os ramos de embutidos, ovos, mel e pescados também foram incluídos na medida ministerial.
— É importante para todas as agroindústrias gaúchas porque todas estão com alguma dificuldade de escoamento da sua produção. Muitas feiras foram suspensas ou adiadas — avalia Eugênio Zanetti, vice-presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado (Fetag-RS).
Sobre a portaria
- Com a portaria nº 1.114/2024, fica autorizado, em caráter excepcional por 90 dias, a comercialização interestadual de produtos de origem animal de agroindústrias gaúchas não integrantes do Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Sisbi-Poa)
- Ou seja, passam a poder ser vendidos produtos apenas registrados no Serviços de Inspeção Estadual (SIE) ou Municipal (SIM). Não em âmbito federal
- A produção, no entanto, deverá ter rastreabilidade, com as origens, quantidades e destinos informados ao Ministério da Agricultura
- Nos próximos dias, sairá uma instrução orientando todos os procedimentos para esse comércio ocorrer de forma legal e devidamente rastreada
- O Ministério da Agricultura também já acenou para uma força tarefa que ajude essas agroindústrias a se adequarem ao SISBI ou Selo Arte — certificações que permitem, rotineiramente, a comercialização para outros Estados