Com três das últimas quatro safras frustradas, pelo clima ou pelo mercado, os produtores de arroz do Estado tiveram nas cheias recentes a gota d'água para acentuada crise do setor. Tanto que a Federação das Associações de Arrozeiros do Estado (Federarroz-RS) enxerga na securitização das dívidas a única saída possível neste momento. A proposta de adotar a medida — utilizada anteriormente na década de 1990 — será formalmente apresentada à ministra da Agricultura, Tereza Cristina, com quem a entidade tem reunião marcada para amanhã em Brasília.
— A diretoria da entidade nos obrigou a tomar uma postura diferente desta vez, vista toda a conjuntura. Achávamos que teríamos uma boa safra e, como no Mercosul havia problemas, pensávamos estar próximos de uma possível capitalização. Esse quadro mudou muito nos últimos 30 dias, sobretudo na Fronteira Oeste e na Campanha, que têm 45% da área de arroz do Rio Grande do Sul — diz Henrique Dornelles, presidente da Federarroz.
Os prejuízos totais da cultura seguem sendo calculados, mas o entendimento é de que, daqui para a frente — e quando as águas baixarem —, só tendem a crescer. Na semana passada, a projeção era de que os arrozeiros deverão colher quase 1 milhão de toneladas a menos do que no ano passado. Por isso a decisão de pedir a securitização.
— Se algo não for feito rapidamente, a área de arroz do Estado cairá drasticamente na próxima safra — estima o dirigente, acrescentando que em um quadro como esse, haveria risco de desabastecimento ( o RS produz 70% da colheita nacional).
A securitização é diferente da simples renegociação de financiamentos ou prorrogação das datas de vencimento, o que é permitido pelo Manual do Crédito Rural. Pelo mecanismo que será solicitado, débitos com variados prazos, juros e perfis são transformados em dívida única. Segundo o economista-chefe do Sistema Farsul, Antônio da Luz, o recurso "não é um bicho de sete cabeças", sendo algo normal no sistema financeiro. O que o torna fora do comum para o meio rural, acrescenta, é a falta de instrumentalização para que seja feito e o fato de não se saber como governo entra nesta história.
— Que é necessária, não tenho dúvida. Não só necessária como justa. O que tem de ser discutido é o quanto o governo deve participar dela.
A securitização no campo
- O setor rural teve no final da década de 90 um processo de securitização que foi fundamental para que a produção voltasse a ser financeiramente viabilizada no Brasil.
- Naquela época, o país vivia um período de grande instabilidade e inflação. Em razão da conjuntura, com sucessivos planos econômicos malsucedidos, a dívida de financiamentos agrícolas foi inflada. O comparativo feito é o de que, por conta da mudança de indexadores, o produtor, muitas vezes, ia dormir tendo financiado um trator e acordava devendo 10.
- Com o mecanismo, as dívidas foram transformadas em débito único com a União. Na época, houve subsídio por meio de juro equalizado pelo governo federal.