Quase 10 anos após a CEEE-G (braço de geração da companhia) vencer o leilão de venda de energia para construção do parque eólico Povo Novo em Rio Grande, o projeto não se concretizou. Nesse meio tempo, as primeiras obras estruturais começaram e pararam, os contratos com os proprietários dos terrenos venceram e a estatal até foi vendida. Agora, um novo capítulo na história: a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) votou pelo cancelamento da outorga das usinas, ou seja, da autorização para que gerem a energia.
No voto do diretor Hélvio Neves Guerra, ao qual a coluna teve acesso, ele destaca que, ainda em setembro do ano passado, mandou um ofício à Companhia Florestal do Brasil, que é controlada pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e que comprou a CEEE-G, solicitando a apresentação de um plano para a viabilidade da implantação e operação das centrais geradoras.
"Tendo constatado que desde a assunção do novo controlador não houve qualquer demonstração de avanços na implantação do projeto, encaminho meu voto acolhendo a recomendação dos Termos de Intimação e propondo a revogação da outorga da EOL Povo Novo, Fazenda Vera Cruz e Curupira", diz parte do voto.
No documento ao qual a coluna teve acesso, já há o despacho do diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, cancelando a outorga. A agência, porém, ainda não confirmou oficialmente à coluna que os direitos foram revogados.
O leilão de 2013 foi vencido pela CEEE-GT com a central geradora eólica Povo Novo, composta pelas usinas Povo Novo, Fazenda Vera Cruz e Curupira, as três de Rio Grande. Na ocasião, o investimento anunciado era da ordem de R$ 265 milhões. O projeto foi elaborado pela empresa Epcor e vendido à CEEE.
— A CEEE comprou e começou a construir o parque éolico. Contratou empresas, comprou equipamentos, começaram a fazer as obras estruturais físicas nas quais seriam instalados os aerogeradores, e de uma hora para outra, pararam, sumiram e não deram retorno para os proprietários do terreno, que tinham arrendado parte para o projeto — explica Guilherme Furtado Gomes Antunes, que trabalha com o advogado Manoel Sampaio Antunes, que, por sua vez, está representando seis famílias cujos terrenos receberiam o parque eólico.
De acordo com Antunes, os primeiros contratos estão com prazos vencidos. Ele diz que as famílias deveriam começar a receber pela geração de energia já em 2015, mas nada aconteceu. Ele também comenta que, como as obras começaram, os terrenos sofreram intervenções, como retirada de porteiras, e que, com a paralisação, elas não foram repostas.
— Quando veio a história de privatizar, a CEEE procurou os proprietários para negociar uma indenização e para refazer os contratos, pois o projeto estava incluso no edital de venda. Mas muito próximo de ser vendida, pararam de falar novamente. Nossa interpretação é que os órgãos reguladores, como o Tribunal de Contas, não apontaram que os contratos com os proprietários estavam irregulares e, por conta disso, a CEEE desistiu de negociar. Deixou a situação para a CSN resolver, sem avisá-los — crítica Antunes.
Quando a CSN comprou a CEEE-G, chegou a comentar sobre o interesse de investir no parque Povo Novo. Em entrevista à colunista Marta Sfredo, estimaram em um ano o prazo para "remover desafios regulatórios" e mais dois a três anos para construção.
Em nota, a CEEE-G disse que "está tomando as medidas necessárias para reversão da decisão da ANEEL, a fim de possibilitar a continuidade das ações que vêm sendo adotadas para implantação do empreendimento.”
Sobre a alegação de que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) não apontou irregularidades no contrato, o órgão respondeu que constatou a situação na época, mas que como era uma "demanda entre particulares", não cabia ao Tribunal analisá-la.
Já o Governo do Estado, por meio da Secretaria de Meio Ambiente, disse que "o interesse do Estado do Rio Grande do Sul é viabilizar a instalação de projetos em energia renovável. Investimentos ou desinvestimentos no Parque Eólico Povo Novo dizem respeito ao empreendedor. O projeto em Rio Grande, contudo, pode ser levado a termo pela empresa em outro formato".
Sobre perda de outorga
Rio Grande tem outro projeto conhecido que perdeu a outorga da Aneel por atraso na execução, não cumprindo prazos para fornecer a energia vendida no leilão. Trata-se da usina térmica do complexo de R$ 6 bilhões que a cidade tenta, agora, recuperar. Ele era da Bolognesi, mas o grupo espanhol Cobra quer assumí-lo. Para isso, a agência reguladora precisa aceitar a transferência e recuar na retirada da outorga. O último capítulo dessa saga é, após mais uma nota técnica negativa da Aneel, sugerir uma mudança no modelo de contrato, disse à coluna o prefeito Fábio Branco, que tem ido com frequência a Brasília tratar do assunto.
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Com Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br)
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