Quais as projeções para a crise da logística mundial e para a falta de insumos? A coluna perguntou sobre isso no balanço de final de ano da Fecomércio-RS. A entidade espera crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro de 0,9% no ano que vem. Confira a resposta do economista Marcelo Portugal, consultor da federação que representa o comércio de bens e de serviços:
- No caso específico do transporte, eu acho que ainda vai demorar um certo tempo. Encareceu barbaramente. Se gastava em torno de US$ 4 mil para trazer um contêiner. Hoje, gasta US$ 11 mil, US$ 12 mil. Tem um site na internet que mostra a posição dos navios, tem portos, como os da costa pacífica, onde você vê aqueles pontinhos todos parados. Não tem lugar para ele entrar, e, como ele não consegue soltar, o contêiner não fica disponível para ser exportado para outro lugar. Começa a faltar e sobe o preço. A ideia que eu tenho, conversando com pessoas da área, é de que pelo menos no próximo semestre isso vai continuar a ser um problema sério, na parte de contêineres e navios. As pessoas da área esperam que alguma melhoria comece a ser observada a partir de junho, julho do ano que vem, supondo, obviamente que os volumes de consumo continuem a fazer o que eles estão fazendo agora, que é sair dos bens e voltar para os serviços. Esse que é o problema: falta contêiner porque todo mundo resolveu consumir bens em vez de consumir serviços. No caso dos automóveis, aí a história é outra, é a cadeia de suprimentos. São dois problemas que eu acho que devem ser tratados separados. O problema de falta de contêineres afeta, praticamente, quase toda a indústria. O problema de falta de suprimentos afeta algo como um quinto, um quarto da indústria, que são os caras que acharam que não ia ter uma boa demanda pós-pandemia e cancelaram as ordens. Caso da indústria automobilística, eu gosto de citar, é emblemático. Todo mundo achou que as pessoas iam parar de andar de carro e parar de comprar carro. Então, a indústria automobilística cancelou praticamente todas as compras, ou diminuiu significativamente as compras de semicondutores. Por outro lado, outra parte da indústria eletroeletrônica apostou que ia voltar, basicamente celulares, televisão, toda essa área que está ligada informática. O cara achava que, com a quarentena, você iria precisar de mais televisão, mais geladeira. Então, boa parte dos semicondutores que iriam para os automóveis começaram a ser vendidos para outras áreas da indústria. Aí, quando os automóveis falaram que também queriam, o cara que produz semicondutor falou "você vai entrar na fila, porque agora eu já vendi a produção dos próximos três, quatro, cinco meses, você vai ter que entrar na fila". Esse, eu acho que demora um pouco mais. Ele é muito desigual. Tem certos setores onde falta muito, e outros onde falta muito pouco.
Eles estão projetando que essa demanda vai continuar, porque estão sendo erguidas fábricas de chips, fábricas de garrafas. As empresas siderúrgicas estão apostando em indústria do aço, erguendo as estruturas para produzir. Podemos projetar normalização na parte de suprimentos? E a intenção de setores de nacionalizar a produção?
Olha, o que eu vou te dar é mais feeling do que previsão stricto sensu, mas acho que para gente voltar lá para o 5,1%, acho que só no último trimestre do ano que vem. Eu acho que é depois da normalização dos contêineres, depois da normalização do fluxo marítimo de entregas. Esse é um grande problema que gerou a ideia de as pessoas dizerem "tá, então vamos começar a produzir no Brasil em vez de produzir lá, porque a gente não precisa do navio para trazer". Isso tem seus pontos positivos e negativos. É verdade que, em momentos de crise, é melhor ter o produtor perto porque fica mais fácil. Só que isso tem um custo. Fora da crise, custa muito mais caro produzir aqui do que produzir na China. A gente produz na China não é porque a gente gosta do chinês, é porque é mais barato. Eles produzem em escala, e tudo na indústria que produz em escala o custo médio cai, você vende por um preço mais barato. Então, se você quiser internalizar, fazer substituição de importações para usar o termo, a gente tem que saber que ao fazer isso, teremos um custo médio maior durante todos os anos em que não existir a crise. Eu acho que mesmo que a gente internalize a produção, o que vai acontecer é que depois de dois, três anos de produção internalizada, se não tiver mais nenhuma outra crise, o cara vai dizer: "olha, fizemos bobagem", porque o custo é muito mais alto, consegue competir melhor com os concorrentes se comprar da China, e vão, de novo, comprar onde é mais barato.
Ouça também no programa Acerto de Contas (domingos, às 6h, na Rádio Gaúcha):
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Colaborou Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br)
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