O áudio que circulou na última semana com uma mulher orientando colegas da empresa a contratarem só "pessoas bonitas" realmente é de uma funcionária da rede de farmácias São João. A empresa confirmou a informação à noite passada ao delegado de Polícia de Imbé, Antônio Carlos Ractz Júnior, que registrou ocorrência no início da semana e abriu inquérito para investigar o caso. Testemunhas foram chamadas para esta sexta-feira (22), mas o depoimento foi adiado.
Advogado da empresa que falou com a polícia, Ricardo Breier acompanhará o diretor de Recursos Humanos até a delegacia de Imbé na próxima terça-feira (26), quando será entregue o celular funcional de onde a trabalhadora enviou a mensagem para um grupo de gerentes de lojas do Litoral. A funcionária, que ainda não teve o nome divulgado, tem cargo de coordenadora e está há 13 anos na São João. A empresa irá demiti-la. Ela também será chamada a depor na polícia.
- Há crimes naquele áudio, como de homofobia. Vamos questioná-la se as orientações são da empresa - disse o delegado.
Outro inquérito tinha sido aberto pelo Ministério Público do Trabalho (MPT-RS). O entendimento do órgão é de que a empresa também é responsável no caso e será chamada a responder na esfera trabalhista ou, ao menos, a firmar um compromisso de ajuste de conduta. Esses documentos são conhecidos por TACs e costumam trazer medidas que as empresas se comprometem a cumprir para mitigar impactos em sociedade.
A coluna conversou também com o departamento jurídico da São João, que informou ter concluído uma sindicância interna que apontou a origem do áudio. Segundo a empresa, os resultados serão entregues à polícia. Em nota de esclarecimento divulgada na segunda-feira (18), a empresa dizia que a mensagem tinham informações falsas publicadas por pessoas desconhecidas e que publicar notícia falsa era crime.
Atualização: Nesta sexta, poucos minutos após esta coluna ser publicada, a empresa divulgou uma nova nota manifestando sobre o caso. Nela, afirma que a sindicância interna constatou que o áudio foi enviado pela funcionária, sem conhecimento da direção. Reforça que foi um ato isolado e que não condiz com as práticas da empresa. Segue a íntegra do texto:
"A Rede de Farmácias São João vem, por meio de nota, novamente, reafirmar seu compromisso e respeito incondicional com a diversidade e inclusão. Como já foi comunicado, a empresa repudia toda e qualquer manifestação que possa contrariar ao ideal e valores de respeito aos direitos humanos. Há consciência de que a pluralidade é direito de todos e faz parte da Democracia em qualquer Estado de Direito, sendo que ratifica e solidifica o desenvolvimento sustentável e a preservação das liberdades individuais. Neste cenário, nossa Política Interna repudia veementemente toda e qualquer forma de preconceito. Opiniões que contrariem esse ideal, não refletem nossos valores e princípios. A partir desse pressuposto, o processo de contratação promove a diversidade, a inclusão e a cultura de vedação de quaisquer tipos de discriminação. Uma simples visita as lojas podem comprovar que esse é um compromisso real. Em decorrência do áudio veiculado nas mídias sociais, informamos que no dia 18/10/2021, foi instaurado o procedimento de Sindicância Administrativa Interna para apuração e conhecimento da amplitude dos fatos, para a identificação de sua autoria e responsabilidades administrativas. Foi realizada averiguação dos fatos, com respeito ao contraditório e a ampla defesa, colhido os depoimentos internos e ao final, constatou-se que o áudio foi enviado por uma colaboradora sem o conhecimento da Direção e através de um canal paralelo, não reconhecido oficialmente pela empresa. Foi um ato totalmente isolado de uma colaboradora, que não condiz com as práticas da empresa, basta adentrar em nossas lojas. A Sindicância Interna resultou na aplicação das penalidades expressas na Consolidação da Leis do Trabalho. Reforçamos nosso compromisso com a comunidade, colaboradores, autoridades e ao final, ficamos à disposição para maiores esclarecimentos, caso necessário."
O áudio
Ao longo de um minuto e meio, a funcionária fala que está ligando para uma série de lojas para "liberar vagas" de emprego. "Porém, vocês sabem, que entre feio e bonito, é o mesmo preço. Então, vamos cuidar muito nas nossas contratações", diz parte do áudio. Na sequência, ela lista uma série de características que as pessoas não podem ter para serem contratadas, inclusive com cunho gordofóbico e homofóbico. Confira descrição do áudio:
"Bom dia, pessoal. Horários foram alterados. A partir de sexta-feira, não teremos mais diferença de horário no domingo. Ou seja, vamos abrir às 7h30min e fechar no horário que está colocado ali. Precisamos alinhar esses horários das lojas. E uma observação: já estou ligando para as lojas para liberar as vagas para esse mês ainda. Porém, vocês sabem que feio e bonito é o mesmo preço, né gente? Então vamos cuidar muito nas nossas contratações. Pessoas muito tatuadas, vocês sabem que a empresa não gosta. A questão de piercing na língua, no nariz, na testa, não pode, a gente lida com saúde. Pessoas muito gordas, vocês sabem que... Então assim, cuidem as aparências. Cuidem as aparências. Se pegar alguém, né, com todo o respeito, "veado" e tudo mais, tem que ser uma pessoa alinhada, que não vire a mão e fale... né. Então, vamos cuidar as equipes que a gente vai pegar. Vamos pegar gente com a aparência boa, com disposição, com vontade. Porque assim. Eu tenho feito as entrevistas para as lojas de Imbé e tem muita gente boa disponível no mercado, então, não esqueçam: feio e bonito, a gente vai pagar o mesmo preço, então vamos pegar os bonitos, né? Que não somos bobos nem nada. Então, por favor, conto com vocês."
Colunista Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Colaborou Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br)
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