O ato de governar é, há muito entre nós, um consórcio de interesses difusos para outros usos. Agora, as ''machadadas'' escancaram o assalto na área federal, mas na estadual (ou municipal) é igual – muda quase só o CPF dos beneficiários.
Nos governos Lula e Dilma, o PT, o PMDB e a base alugada repartiam o que caía na rede e, em casos extremos, simulavam administrar alguma cousa. Com o interino Temer, idem ibidem. Tudo igualzinho, ainda que Henrique Meirelles dê outra impressão num governo com gente envolvida na Lava-Jato e no qual Eduardo Cunha é um dos oráculos.
Agora, o PT está de fora, mas não nos preocupemos. Lá continuam o PP e os alugados de sempre, mais o PSDB e o DEM, que posava de virgem donzela. E o PC do B virou comunista socorrido por capitalista.
E todos sob a regência do PMDB, como revela Sérgio Machado, com a autoridade de ex-senador do PSDB, candidato ao governo do Ceará pelo PMDB e, por indicação dos chefões deste partido, levado por Lula (e Dilma) à direção da bilionária Transpetro. Dos alugáveis, só o PDT não aparece – bastavam as falcatruas no ministério do Trabalho, hoje investigadas pela Polícia Federal?
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Em tempos de bonança eles se deleitam, imunes a protestos, panelaços ou buzinaços e até seus palhaços parecem de aço. Qualquer penúria, porém, faz o PT arcar com a culpa sozinho, como se fosse o único consorciado, dono absoluto daquilo que o PMDB maneja tão habilmente, há anos, que parece estar presente apenas nos momentos sem penas. O PP, ''partido paulomalufista'', com a tradição engenhosa de seu guia, fez Paulo Roberto Costa levar à Petrobras a alta tecnologia do assalto.
Em outros órgãos estatais (Dnit, Funasa, Docas, Fundo Nacional de Educação, Dnocs e Banco Nordeste) a corrupção interna ''é ainda menos ortodoxa'' (ou maior), pois ''a Petrobras é a madame mais honesta dos cabarés do Brasil'', contou Machado em delação premiada, fazendo graça com nossa desgraça.
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O sistema partidário apodreceu-se pela ação obscena dos chefetes políticos, cujo único ideal é eleger-se em qualquer posto para enriquecer-se. Ou não é isto que mostram as ''machadadas'', em que poucos se salvam?
''Collor era o mais voraz'', contou Machado, que distribuiu propinas de milhões como se fosse esmola a mendigo de rua. Renan Calheiros teria recebido R$ 32 milhões, sendo R$ 24 milhões em espécie, mais ''mesada'' de R$ 300 mil. Romero Jucá, atual presidente nacional do PMDB, R$ 21 milhões e R$ 200 mil de mesada. O ex-presidente Sarney, R$ 18,5 milhões de contratos da Transpetro. O senador e ex-ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, R$ 24 milhões, mais R$ 300 mil ao mês.
Queria R$ 500 mil e alegou: ''É ainda menos do que ganha, por mês, um amigo titular de Cartório''.
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Há cifras menos tonitruantes, mas significativas, como o R$ 1 milhão que Aécio Neves teria recebido ''em espécie'' em 1998, de um ''fundo'' manejado por Sérgio Machado, então senador pelo PSDB. Ou R$ 1 milhão e 500 mil dados ao candidato do PMDB a prefeito de São Paulo em 2012, a pedido do vice-presidente Temer, que ''sabia ser recurso ilícito de empresas contratadas pela Transpetro''. Teria gerenciado, ainda, R$ 40 milhões que o grupo JBS destinou aos senadores do PMDB.
Temer nega ter-se encontrado com ''o cidadão Machado'', como o chamou agora, em pronunciamento formal, tentando apagar o incêndio.
Os envolvidos se calam ou alegam que ''são doações legais'' declaradas à Justiça Eleitoral. Mas a pseudo-defesa é a confissão de outro crime: o certo é dizer ''doações legalizadas'', oriundas de dinheiro sujo. Lavagem de dinheiro é isto!
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Nesses relatos de espanto, a sombra do conluio de políticos e grandes empresários se transforma em sol. Demitiu-se agora o terceiro ministro de Temer, Henrique Alves, talvez sob temor de novas ''machadadas'' além dos modestos R$ 1 milhão e meio já revelados.
No futebol foi mais fácil. Demitido Dunga, veio Tite, que em dezembro de 2015 assinou o manifesto em que os grandes do esporte ''exigiam a destituição ou renúncia do presidente da CBF, Marco Polo del Nero'', sob suspeita de corrupção.
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