Eu estava vendo desenhos animados na TV, num apartamento pequeno e escuro – meu lar provisório em São Paulo –, quando fui interrompido por uma “notícia extraordinária”: o presidente Kennedy fora assassinado. Aos cinco anos, eu não sabia quem Kennedy era, mas intuí que deveria ser alguém importante para derrubar o Pica-Pau e deixar aos prantos a senhora minha mãe.
Com o passar dos anos, passei a admirar e depois desprezar Kennedy, filho do gângster que fraudou as eleições, não pagou a promessa que fez à Máfia e viu o rebento ser rebentado por ela. Acredite se quiser: discuti com Bob Dylan sobre Kennedy, num hotel em Budapeste, e sugeri que lesse O Lado Negro de Camelot, de Seymour Hersh. Acho que não adiantou, pois Dylan lançou faz pouco um épico de 17 minutos carpindo a morte do John errado, após ter pranteado o John certo, Lennon, num épico menor, de apenas sete.
O primeiro presidente americano que acompanhei em “tempo real” foi Nixon, que emergiu das trevas do macartismo para trazer “lei e ordem” à conflagrada América dos anos 1970. Ele era corrupto e vil, fez os EUA chafurdarem no Vietnã, deu distintivo do FBI para um caquético Elvis Presley e saiu pela porta dos fundos da Casa Branca. Sempre achei Ford, que o substituiu, uma espécie de Galaxie: um banheirão queimando óleo, impossível de estacionar.
Jimmy Carter não só ajudou a enterrar as ditaduras do Cone Sul, que Kennedy e Nixon botaram no poder, como levou Dylan e The Band para jantar na Casa Branca. Dylan foi, mas não disse nada. Então, veio Ronald Reagan, dedo-duro em Hollywood, canastrão e capacho de John Wayne, ama-seca dum chimpanzé. Falei sobre ele com o lendário Lawrence Ferlinghetti e, sujeito cruel que sou, cumpri a promessa que fiz ao poeta: festejei quando, corroído pela demência, Reagan bateu as botas em 2004. Antes de partir desta para pior, ele havia passado a bola para George Bush, caipira texano, magnata do petróleo, mas que perto do filho, o Bushinho, incapaz de soletrar po-ta-to, parecia um tribuno romano.
Após o primeiro Bush desocupar a moita, veio Bill Clinton, que fumou, mas não tragou, embora não tenha sido o que me disseram os membros do The Band, de quem Clinton era fã. Clinton levou Dylan e The Band para jantar na Casa Branca. Dylan foi, mas não disse nada. Depois de Bush II – a Missão, veio Barack Obama, um ícone de ébano, que fumou, tragou e condecorou Dylan na Casa Branca. Dylan foi e grunhiu “thanks”. Aí, chegou a vez desse ignóbil, ególatra e mitômano Donald.
Não sei quando – ou se – Bob Dylan será convidado para jantar de novo na Casa Branca. Só espero que ele não tenha que recorrer à Suprema Corte pela honraria de ir lá não dizer nada.