Embora me considere hoje mais um escritor – e recentemente tenha virado, oh céus, youtuber –, além de andar exercendo por aqui o ofício de cronista, o fato é que sou e creio que sempre serei jornalista. E você sabe qual o objetivo primordial de todo jornalista, não sabe? Ora, é dar o furo. Não que eu já tenha dado muitos ao longo de minha carreira jornalística. A primeira vez que dei, aliás, nem foi aquele furo, embora tenha sido um feito, um prodígio, uma proeza: quando o inacessível Bob Dylan veio ao Brasil, em 1990, consegui me aproximar dele e o entrevistei. Não foi pouca coisa – a primeira vez a gente nunca esquece. Mas não chegou a ser assim um furo que arrombasse a história do jornalismo, né?
Por isso, depois de quase 50 anos na ativa, sigo querendo dar o furo. E confesso, gostaria de dar em cima do presidente da República. Não um furo como aquele que o perfurou em Juiz de Fora. Nem como os furos que transpassaram o corpo de um de seus heróis, um certo capitão... Adriano. Mas um furo conectado a esses dois. Vá, por exemplo, que eu descobrisse que o homem que o esfaqueou é só um desequilibrado e que o tresloucado gesto decidiu as eleições de 2018? Ou, mais impactante ainda, revelasse que foi o próprio presidente quem sugeriu a seu filho homenagear o tal capitão com a mais alta condecoração do Legislativo fluminense? E que, no dia em que tal honraria foi prestada, o dito Adriano estava preso, acusado de assassinato?
Ou – aí sim, furo explosivo – desvendasse eu por onde anda Fabrício Queiroz, o elo perdido entre o finado miliciano e a primeira-família? Ou, dando um furo atrás do outro, penetrasse nas entranhas do gabinete do deputado-filho elucidando ali o tal esquema da "rachadinha"? Um furo e uma rachadinha: que mistura explosiva.
E, como os jornalistas acham – e podem estar certos – que a vida privada de pessoas públicas é do "interesse presumido do leitor", vá que eu acabe dando meu furo justo sobre a esposa do presidente, anunciando que a avó dela era traficante e a mãe e dois de seus tios já tiveram rolos com a lei? Ou que meu furo – bom, no caso, dois furos – se relacione aos outros dois filhos do mandatário, e eu explicasse por que um deles vive cutucando a imprensa com a vara curta e o outro anda armado disparando fake news?
O quê? Esses furos já foram dados? Alguém deu os furos antes de mim? É papo furado? Ah, bom. Então, não preciso pedir desculpas por supostas insinuações – como se eu fosse, digamos, um motorista de Uber. Ou um presidente de segunda de uma nação de Terceiro Mundo. E ainda me mantenho sem dar o furo.
Mas continuo louco para dar.